segunda-feira, 18 de agosto de 2008

A nova geopolítica da energia


Michael T. Klare - The Nation

Os estrategistas militares norte-americanos estão se preparando para as futuras guerras que certamente serão empreendidas, não por questões de ideologia ou política, mas em luta por recursos crescentemente escassos.

Enquanto a atenção diária do exército norte-americano está concentrada no Iraque e Afeganistão, os estrategistas norte-americanos olham para além destes dois conflitos com o objetivo de prever o meio em que irá ocorrer o combate global em tempos vindouros. E o mundo que eles enxergam é um no qual a luta pelos recursos vitais — mais do que a ideologia ou a política de equilíbrio de poder — domina o campo da guerra. Acreditando que os EUA devem reconfigurar suas doutrinas e forças para prevalecer em semelhante entorno, os oficiais mais veteranos deram os passos necessários para melhorar seu planejamento estratégico e capacidade de combate. Apesar de que muito pouco disto tudo chegou ao domínio público, há um bom número de indicadores-chave.

A partir de 2006, o Departamento de Defesa, em seu relatório anual “Capacidade Militar da República Popular da China”, coloca no mesmo nível a competição pelos recursos e o conflito em torno de Taiwan como a faísca que poderia desencadear uma guerra com a China. A preparação de um conflito com Taiwan permanece como “uma razão importante” na modernização militar chinesa, segundo indica a edição de 2008, mas “uma análise das aquisições recentes do exército chinês e do seu pensamento estratégico atual sugere que Pequim também está desenvolvendo outras capacidades do seu exército, para outro tipo de contingências, como, por exemplo, o controle sobre os recursos.” O relatório considera, inclusive, que os chineses estão planejando melhorar sua capacidade para “projetar seu poder” nas zonas que em obtêm matérias-primas, especialmente combustíveis fósseis, e que esses esforços podem supor uma significativa ameaça para os interesses da segurança norte-americana.

O Pentágono também está solicitando, neste ano, fundos para o estabelecimento do Africa Command (Africom), o primeiro centro de mando unificado transatlântico desde que, em 1983, o presidente Reagan criou o Central Command (Centcom) para proteger o petróleo do Golfo Pérsico. A nova organização vai concentrar seus esforços, supostamente, na ajuda humanitária e na “guerra contra o terrorismo”. Mas em uma apresentação na Universidade Nacional de Defesa, o segundo comandante do Africom, o Vice-Almirante Robert Moeller, declarou que “a África tem uma importância geoestratégica cada vez maior” para os EUA — o petróleo é um fator-chave — e que entre os desafios fundamentais para os interesses estratégicos norte-americanos na região está a “crescente influência na África” por parte da China.

A Rússia também é contemplada através da lente da competição mundial pelos recursos. Apesar de que a Rússia, diferentemente dos EUA e da China, não precisa importar petróleo nem gás natural para satisfazer suas necessidades nacionais, esse país quer dominar o transporte de energia, especialmente para a Europa, o que tem causado alarme nos oficiais veteranos da Casa Branca, que receiam uma restauração do status da Rússia como superpotência e temem que o maior controle desse país sobre a distribuição de petróleo e gás na Europa e na Ásia possa enfraquecer a influência norte-americana na região.

Em resposta à ofensiva energética russa, a administração Bush está empreendendo contramedidas. “Tenho a intenção de nomear... um coordenador especial de energia, que dedicará especialmente todo o seu tempo à região da Ásia Central e do mar Cáspio”, informou, em fevereiro, a Secretária de Estado Condoleezza Rice ao Comitê de Assuntos Exteriores do Senado. “É uma parte verdadeiramente importante da diplomacia.” Um dos principais trabalhos deste coordenador, segundo declarou Rice, será o de promover a construção de oleodutos e gasodutos que cincunvalem a Rússia, com o objetivo de diminuir o controle desse país sobre o fluxo energético regional.

Tomados em conjunto estes e outros movimentos semelhantes sugerem que houve um deslocamento da política: em um momento em que as reservas mundiais de petróleo, gás natural, urânio e minérios industriais chave —como o cobre e o cobalto— começam a diminuir e a demanda por esses mesmos recursos está disparando, as maiores potências mundiais desesperam-se por conseguir o controle sobre o que resta das reservas ainda sem explorar. Estes esforços geralmente envolvem uma intensa guerra de lances nos mercados internacionais, o que explica os preços recordes que estão alcançando todos estes produtos, mas também adotam uma forma militar, quando começam a ser feitas transferências de armamento e são organizadas missões e bases transatlânticas. Para reafirmar a vantagem dos EUA —e para contrabalançar movimentos similares da China e outros competidores pelos recursos— o Pentágono situou a competição pelos recursos no próprio centro do seu planejamento estratégico.

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