Mostrando postagens com marcador Facebook. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Facebook. Mostrar todas as postagens

sábado, 15 de janeiro de 2022

O FUTURO DA INTERNET: Web 3.0

 


A Web 3.0 pode transformar a internet — e toda a sociedade


Por Pedro Doria, para Canal Meio (canalmeio.com.br).

Existem duas teses circulando a respeito de como será o futuro da internet. Uma é o Metaverso. A outra, a Web 3.0. O Metaverso é fácil de explicar — Mark Zuckerberg, fundador e CEO do Facebook, vem batendo nesta tecla com firmeza há vários meses. É uma visão que junta o mundo digital no qual já estamos com realidade virtual. Quase ficção científica: podemos nos reunir com amigos a quilômetros de distância como se estivéssemos num só ambiente. Vemos as pessoas em três dimensões com óculos especiais. Este futuro, do ponto de vista tecnológico, está a no mínimo dez anos de distância, se não for mais. Com a Web 3.0 é diferente. Ela não é simples de explicar, mas boa parte da tecnologia para torna-la viável já existe. Se acontecer, e tudo indica que começará a acontecer brevemente, ela não muda só a internet. Muda a própria estrutura de como a sociedade se organiza. Transforma a economia e a política de formas potencialmente radicais. O que falta para ela não é ser inventada, isso já aconteceu. Falta ser simples para que todos a compreendam e saibam usar.

Como chegamos até aqui

Quem chegou à internet na última década do século 20 conheceu a Web 1.0. Foi ela que criou, em inúmeros pontos do mundo, uma quantidade imensa de pensadores otimistas com o potencial democrático da nova tecnologia. Aquela web inicial era descentralizada. Toda pessoa poderia ter um site, caso trabalhasse para isso. Todo mundo poderia conectar o próprio servidor à internet.

O que muita gente descobriu rápido é que estar na internet dava trabalho. Para manter de pé os negócios iniciais que nasceram ali era preciso manutenção constante de servidores, pesado investimento em segurança, contornar panes a toda hora. Era impossível, naquela web, publicar informação sem muito conhecimento técnico e algum investimento em dinheiro. Cada página tinha de ser escrita em código. Nada era simples.

A Web 2.0 nasceu para resolver todos os problemas que existiam na primeira versão.

As nuvens, por exemplo, atacaram a dificuldade com infraestrutura de hardware. Deixou de ser preciso manter os próprios servidores — basta contratar o serviço de uma nuvem e armazenar nelas seu conteúdo. A provedora de nuvem, uma empresa especializada, resolve quaisquer dificuldades técnicas que surjam.

A exigência do conhecimento técnico para cada pessoa publicar foi resolvida pelas plataformas. Primeiro vieram os blogs. Ninguém precisava mais escrever em código. Depois, quem queria publicar vídeos podia simplesmente abrir seu canal num YouTube. Por fim vieram as redes sociais.

Se os blogueiros, no período de transição da Web 1 para a 2, penavam para encontrar audiência, nas redes este problema foi resolvido. Sempre que uma rede juntava gente o bastante, os algoritmos de inteligência artificial se tornam capazes de achar o público que pode se interessar por aquele tipo de conteúdo. As plataformas trazem o público para quem deseja ser ouvido, assistido ou lido.

As plataformas e seus algoritmos resolveram, assim, dois problemas essenciais que a Web 1 apresentava.

Aquela internet inicial era tão complexa tecnicamente que só gente com conhecimento especializado e empresas conseguiam participar. A Web 2 é a rede na qual todo mundo constrói seu conteúdo, todos podem ter sua voz. Por conta disso, a Web 2 se tornou atraente o bastante para trazer as massas para o mundo digital.

Porque havia pouca gente, e porque era tão difícil publicar online, boa parte da década de 1990 se passou na busca por modelos de negócio que tornassem a internet viável economicamente. Mas os algoritmos da Web 2.0, por serem capazes de encontrar o público certo para cada um que participa, também têm a habilidade de achar os olhos ideais para qualquer peça publicitária. O problema do modelo de negócios desapareceu e, em seu lugar, ergueram-se corporações capazes de crescer em velocidade e escalas que o capitalismo jamais havia testemunhado.

Mas nada vem de graça.

O apelo democratizante da Web 1 se baseava no fato de que aquela rede trazia promessas por ser descentralizada. Cada um conectava seu servidor e disputava de igual para igual o público pela arte do convencimento. Como era difícil, poucos faziam.

No primeiro momento, as plataformas pareceram oferecer facilidades para quem tinha dificuldade técnica de publicar suas ideias. Não bastasse, facilitavam o acesso ao público. Mas, logo ficou claro, de democratizante havia muito pouco ali. Se a Web 1 era descentralizada, a Web 2 começou a centralizar a internet em um número limitado de plataformas. O público está não mais em qualquer lugar da grande rede, mas dentro das quatro paredes virtuais erguidas por um número pequeno de corporações.

No interior destas paredes, os algoritmos têm viés, incentivam um tipo de informação em detrimento doutra. De sérios problemas de autoimagem para adolescentes à manipulação do debate público que incentiva mentiras com consequências graves em troca de eleição, a tecnologia da Web 2 se mostrou uma ameaça à sociedade.

O modelo de negócios também se mostrou nocivo. Em essência, transforma a venda dos dados pessoais de cada pessoa na fonte de lucro. E quebra um equilíbrio necessário e fundamental para qualquer mercado. São as pessoas, e o que elas produzem, que dão valor às plataformas. Ninguém entra no Facebook ou no YouTube pelo que estas companhias pagam para produzir. Entra-se pelo conteúdo que amigos ou gente interessante apresenta, em muitos caos sem receber nada por isto. Estas mesmas empresas, por conta das consequências de como suas plataformas se estruturaram, ameaçam democracias.

Algumas das plataformas, como o YouTube, ainda distribuem parte de seus lucros a quem cria conteúdo. Outras, a maioria das redes, ou pouco ou nada distribuem. A concentração destas altas margens de lucro nas mãos das plataformas viabilizaram a criação dos maiores oligopólios da história do capitalismo.

Violam privacidade, ameaçam saúde e democracias, concentram lucros como jamais houve. É isto que a Web 3 ambiciona resolver.

Plataformas e protocolos

De cara, há um desafio técnico importante para enfrentar. Uma rede centralizada se baseia em plataformas. Uma descentralizada, em protocolos.

Protocolos são linguagens comuns que todos podem usar. O protocolo 4G, assim como o 5G, é composto por uma série de instruções técnicas sobre como cada aparelho celular precisa ser montado para que possa se conectar àquela rede de telefonia. Assim, Samsung, Apple ou Motorola podem fabricar aparelhos que sejam plenamente compatíveis entre si.

A internet é construída em cima de protocolos. O TCP/IP regula o tráfego dos dados e a comunicação entre cada servidor. O HTTP define como páginas da web encontram umas às outras através de links. E qualquer um pode construir equipamento que se integre à rede ou um software que apresente páginas nesta rede.

Uma plataforma é um ambiente fechado. O Facebook é uma plataforma, o YouTube outra, o Twitter uma terceira. WhatsApp. Instagram. TikTok. Sem a permissão do Facebook, uma empresa privada, ninguém constrói algo que se encaixe livremente em seu espaço. Vale para qualquer plataforma.

Há vantagens. Plataformas, por serem fechadas e privadas, podem evoluir rapidamente. Se os donos do Twitter desejam incluir uma função nova, o CEO manda, dois ou três programadores desenvolvem e logo está no ar. Plataformas se adaptam rápido e se sofisticam com frequência.

Com protocolos não funciona assim. Como são linguagens públicas, para que uma mudança tenha efeito é preciso que todos empenhados nela concordem e a implementem. A governança é complexa. Um novo protocolo para redes celulares demora dez anos para ser criado e posto no ar. Estamos ainda caminhando para a versão 2 do protocolo HTTP, da web.

A capacidade de mexer em protocolos, por ter de ser consensual para um número grande de jogadores, faz deles instrumentos muito lentos de inovação. Eles não têm a agilidade de plataformas.

O desafio da Web 3 é este. Como descentralizar novamente a internet, criando um ambiente no qual todos se encaixem com facilidade, mas sem perder a capacidade de contínua inovação que as plataformas da Web 2 trouxe.

Entra o blockchain

A bitcoin, a primeira criptomoeda lançada em 2009, apresentou ao mundo o que pode solucionar este dilema: o blockchain. Em uma das muitas definições que podem ser encontradas online, o blockchain é definido como “um sistema que permite rastrear o envio e recebimento de alguns tipos de informação pela internet”. Ou “pedaços de código gerados online que carregam informações conectadas – como blocos de dados que formam uma corrente – daí o nome.” Blocos de informação criptografados numa corrente.

Quem tem uma nota de dinheiro na mão e compra algo, entrega aquele papel. O dinheiro sai da carteira e entra na caixa registradora. Com o digital não é tão simples. O dinheiro digital não é físico, é um conjunto de bytes. Quem envia uma fotografia pelo WhatsApp para um amigo não deixa de ter aquela imagem — uma cópia é criada no celular de quem a recebeu. Para dinheiro, não funciona. O dinheiro precisa deixar de existir numa carteira para entrar na outra. É isto que o blockchain resolve. Em cada bitcoin há um blockchain que a identifica como uma moeda única e que carrega sua história, A cada nova transação, um elo novo de informação é incluído no blockchain — de que carteira saiu, em qual entrou, em que momento. E como esta informação é toda criptografada, o dono daquela moeda não tem como modificar esta informação, fraudar a história de cada movimentação.

É por isto que a bitcoin, como todas as outras moedas que utilizam a tecnologia blockchain, são chamadas de criptomoedas.

Este mundo financeiro do cripto se organizou ao longo da última década. Cada pessoa que tem criptomoedas precisa ter também pelo menos uma carteira digital. Ela pode ser custodiada por uma corretora online, como se fosse uma conta bancária, ou pode estar dentro do computador pessoal de seu dono — como a boa e velha carteira de couro que carregamos conosco. Mas cada moeda, mesmo digital, é única. Não pode estar em dois lugares ao mesmo tempo.

Nestas corretoras, as exchanges, diariamente negociações são conduzidas como num mercado. Nelas entram reais, dólares, euros para a compra de bitcoin, ethereum, solana, e incontáveis outras criptomoedas. É um mercado como qualquer outro, cuja integridade de cada moeda vendida é garantida pelo blockchain.

A questão, logo se percebeu, é que o blockchain pode ser usado para muito mais do que apenas moedas. Para um contrato, por exemplo. Como se garante um contrato digital que duas pessoas assinam? É preciso, em essência, ter certeza de que as duas pessoas concordaram com os termos e que estes termos não foram modificados. Um blockchain faz isso. Nele ficam criptografadas as duas assinaturas e a garantia de que os termos não foram tocados.

Vale para a escritura de um imóvel. Pertencia a Fulano, desde tal data é de Beltrano, e corresponde ao apartamento de tantos metros quadrados localizado num endereço dado. Também funciona para um acordo de casamento — estas duas pessoas, a partir de tal data, tomaram a decisão de compartilhar seguros de saúde mas preferiram manter suas contas correntes separadas. Pode garantir que a tora de uma árvore foi colhida em uma fazenda legal e não no miolo de uma reserva florestal. A fazenda tal tinha tantas árvores plantadas e registradas, cada uma com seu próprio código único, aquela árvore específica tinha um tamanho que lhe permitia um volume tal de madeira e esta mesa hoje vendida consumiu tantos por cento da tora original.

Nenhum papel foi produzido, nenhum carimbo martelado, nenhum selo destacado e colado. Todo o processo é digital e o blockchain traz em si a garantia de que o acordo existe, é imutável, é único.

Um contrato garantido por blockchain não é a mesma coisa que uma criptomoeda. Afinal, existem muitas bitcoins. Mas cada contrato é único. Estes contratos são chamados de NFT — um ‘token não fungível’ na sigla em inglês. Não fungível quer dizer, justamente, que ele é único.

Uma obra de arte digital é única se está atrelada a um NFT, o contrato que descreve suas características. NFT só pode haver um. O conceito de NFT, que hoje já estabeleceu um mercado de arte digital, serve para qualquer tipo de contrato.

Mas como pode, deste conceito do cripto, surgir uma alternativa para a Web 2?

A estrutura da Web 3.0

O login e a senha que utilizamos para entrar no Facebook, ou no Gmail, funcionam um pouco como nossa identidade na internet. Entramos em inúmeros sites com eles. O Face, como o Google, tem um banco de dados centralizado, que estas empresas controlam, onde estão as informações a nosso respeito. Quando usamos um dos dois para garantir nossa identidade e entrar numa loja virtual, muito da informação sobre o que fizemos naquele ambiente é compartilhada com estas empresas. São estes dados sobre nossos hábitos digitais que as tornam valiosas. Em essência, a informação que elas têm e ninguém mais a respeito de uma parcela imensa da humanidade é o que as transformam em gigantescas corporações como nunca antes vistas.

Mas a identidade pode ser também garantida por um NFT. Um NFT emitido pelo governo de um país, ou por uma corretora de criptomoedas, carrega em si, no blockchain, o que torna aquela identidade única. Não há um banco de dados centralizado. Num mundo cripto, o documento de identidade digital de uma pessoa pode estar em seu computador, no seu celular, num chip, numa corretora. É a pessoa, a portadora daquela identidade, que escolhe. A identidade não estará no banco de dados de uma empresa gigantesca que controla as informações atreladas àquela pessoa.

Esta é uma mudança conceitual forte pois permite a criação daquilo que no mundo cripto chamam DAO — organizações autônomas descentralizadas, na sigla em inglês. É uma organização composta por pessoas que se juntam com algum propósito e aderem a um acordo coletivo registrado, claro, num blockchain.

Os membros desta organização não precisam, necessariamente, ter todos o mesmo poder de influenciar nas decisões. Basta que se crie um mercado interno. Quanto mais alguém contribui para o valor da organização, mais ganha tokens. Como se cada DAO tivesse sua própria criptomoeda. E tokens, esta moeda, podem ser gastos para votar a favor ou contra mudanças internas.

Um Instagram, na Web 3.0, jamais seria uma plataforma fechada. Seria uma DAO, uma organização descentralizada. O like que uma foto recebe é um token, uma criptomoeda devidamente armazenada na carteira digital. E não há motivo para que esta ‘moeda’ não seja negociada num mercado aberto em troca de outras criptomoedas. O valor de um like dum Instagram-DAO flutuaria naturalmente em valor, de acordo com a percepção coletiva da importância do que é produzido ali.

Mas não precisa ser um Instagram. Uma DAO pode ser uma empresa de software em que o percentual de trabalho de cada programador no produto final seja devidamente registrado e a cada vez que alguém compre o direito de uso do programa o valor seja redistribuído de acordo com os termos estabelecidos pela organização.

DAOs muito populares, que produzam qualquer coisa que seja percebida como valiosa por muita gente, distribuirão para seus membros estes tokens, estas criptomoedas, que representam valor real em dinheiro.

Partidos políticos, ONGs, empresas privadas, clubes de livro, em essência qualquer agrupamento humano pode se organizar coletivamente na forma de uma DAO. E os termos de cada contrato não precisam necessariamente passar pela remuneração financeira. Podem, mas não precisam. Os estatutos de ONG podem estabelecer que o trabalho não é remunerado, é sempre voluntário. A identidade nacional de qualquer cidadão, por exemplo, pode garantir para ele o direito ao voto a partir de uma idade e o contrato, a Constituição ancorada num blockchain daquela nação, determina que este direito não é negociável. O cidadão nunca perde seu direito de votar e seu voto nunca vale mais do que o de qualquer outro cidadão.

Em teoria, democracias inteiras podem se organizar porque, ao menos tecnicamente, será possível promover eleições e consultas com muita facilidade, a baixo custo, e com integridade garantida. Democracias diretas, onde todas as decisões emanam do voto, tendem a se tornar ditaduras da maioria sem garantias para minorias. Mas isto não quer dizer que eleições ou consultas não possam ser mais frequentes, que a estrutura de Parlamentos não possa ser modificada, as possibilidades são muitas.

O blockchain muda a maneira como se organiza tanto o mundo virtual quanto o físico. Esta é uma característica fundamental da Web 3.0. Ela é uma internet com o potencial de alterar a economia, a política e, por fim, toda a sociedade. Por ser descentralizada, distribui o poder que hoje as grandes corporações digitais mantém pelo controle de plataformas.

É enfim a democracia digital?

A tecnologia por trás da Web 3.0 já existe — ela só é difícil. Difícil de implementar tecnicamente e difícil de explicar, conceitualmente. Mas criptomoedas já estão na publicidade da TV e começam a se tornar populares entre investidores. E um mercado de arte digital baseado em NFTs já se formou, embora seja pequeno. É o início da popularização do conceito. Como tudo na história do digital, primeiro vêm os pioneiros, depois vira aquele tema sobre o qual todo mundo fala mas pouca gente experimentou e aí, enfim, chegam as massas. Estamos na segunda fase.

Há, porém, um debate intenso ocorrendo. No último mês, Jack Dorsey, fundador e há até pouco tempo CEO do Twitter entrou num debate público virulento com Marc Andreessen, sócio do fundo da Andreessen Horowitz, um dos principais investidores em novas companhias do Vale do Silício. As emoções ferveram e o Vale se dividiu.

São, ambos, estrelas de gerações distintas da internet. Quando estudante, Marc Andreessen escreveu o código do primeiro browser gráfico, o Mosaic, e depois fundou a primeira startup gigante da Web 1.0, a Netscape. Foi o primeiro bilionário da era da internet. Dorsey é criador de uma das principais marcas da Web 2.0, o Twitter, e é também fundador e CEO da Block, uma das maiores empresas americanas de pagamentos digitais.

Dorsey acusa de hipocrisia os proponentes da Web 3. Argumenta que, embora muito distinta da Web 2, é uma ilusão dizer que ela seja mais democrática. O poder, ele argumenta, estará nas mãos de quem controla as corretoras de criptomoedas e que os sistemas que interpretam o blockchain serão também poucos. Se este futuro se concretizar, haverá uma infraestrutura central que todos terão de utilizar. Quem controlar esta infraestrutura central poderá até ser menos visível do que os controladores das grandes plataformas, hoje. Mas o poder estará nas mãos destes.

Andreessen e seu sócio, Ben Horowitz, evidentemente discordam. Estão investindo pesado no setor e, ora, apontam que Dorsey mantém suas fichas no modelo atual. A Web 3 ameaça seus negócios.

Ambos têm razão.

A Web 3.0 é uma ideia, um conceito, a imaginação de como a internet pode vir a ser muito diferente de como se apresenta hoje. Não é certo que será assim. Mas, no momento, é o caminho que o futuro parece estar seguindo.

 

Fonte da Imagem:  https://medium.com/machinevision/overview-of-neural-networks-b86ce02ea3d1

domingo, 10 de outubro de 2021

O ódio que o Facebook espalha

 


Por Pedro Dória, para canalmeio.com.br.

O discurso poderia ser de um nazista contra judeus — mas quem o faz em nada parece com um nazista. O monge Wiseitta Biwuntha, mais conhecido por Wirarthu, tem os olhos amendoados, a pele corada tão comum no Sudeste Asiático e a cabeça completamente raspada. Sempre que está em público, veste a roupa típica dos budistas teravada — dhonka e shemdap, que juntos parecem um manto só dum vermelho escuro, quase vinho. Pela aparência, não destoaria se estivesse ao lado o Dalai Lama. Mas não pelo discurso. “Se você comprar de uma loja de muçulmano”, Wirarthu afirma, “o dinheiro não para ali. Este dinheiro, ao fim, será gasto para destruir nossa raça a religião. Esse dinheiro será usado para atrair mulheres budistas e força-las a se converter ao Islã e, quando os muçulmanos tiverem população maior, vão nos engolir, tomar o poder em nosso país e transformá-lo numa nação demoníaca islâmica.” Em Myanmar, mais de 90% da população se identifica como budista. Hoje aos 53, o monge é o rosto mais conhecido do Movimento 969, que defende que budistas devem se casar com budistas, comprar em negócios budistas e trabalhar pela expulsão dos muçulmanos do país.

Wirarthu é um dos mais ávidos defensores da limpeza étnica em Myanmar. É, também, um importante aliado político dos militares nacionalistas.

O monge Wirarthu não está mais no Facebook. Foi expulso em 2018, após o genocídio da minoria rohingya no ano anterior. Mas, até lá, a rede foi a principal plataforma para seu discurso de ódio étnico. E não houve nada de acidental. Em Myanmar, o Facebook foi propositalmente utilizado como ferramenta para construção de um ambiente político instável que levasse à violência. O surgimento da internet do país, um fenômeno recente, coincidiu com a radicalização seguida de colapso da democracia, no início deste ano.

Até 2011, Myanmar era uma ditadura militar, um dos regimes mais fechados do mundo, que tinha como principal rosto Aung San Suu Kyi, a política que venceu o Nobel da Paz, em 1991. Suu Kyi foi libertada no momento em que o regime começou a abrir. Embora não tenha sido permitido a ela concorrer às eleições no primeiro pleito, seu partido venceu 43 das 45 cadeiras do Parlamento e iniciou uma lenta liberalização do país.

Um dos marcos da democratização foi acesso à internet. O preço de um cartão SIM para smartphones despencou, em 2012, de milhares de dólares para centenas. Continuava muito caro, mas tornou-se acessível para uma crosta da classe média alta. Em 2013 o monopólio estatal sobre as telecomunicações caiu e duas operadoras estrangeiras entraram — uma catari, a outra norueguesa. Em 2014, o SIM já custava um dólar, as lojas se encheram de smartphones chineses baratos e o uso de internet, principalmente em plataformas móveis, explodiu.

Como criar um ambiente de desinformação

A cultura digital que se desenvolveu no país a partir dali foi uma centrada no Facebook — a adoção da rede social no país foi a mais acelerada em qualquer nação já registrada pela empresa. Quase instantaneamente, no arco de um ano, mais da metade da população abriu uma conta na plataforma. O fenômeno não passou batido pelo monge Wirarthu. Muito menos pelos militares.

Antes do golpe militar de fevereiro deste ano, Myanmar nunca chegou a ser uma democracia plena. Os generais mantiveram, por toda década de 2010, o poder isolado de reformar a Constituição que havia sido promulgada na ditadura anterior. E a Carta determinava que o poder civil não poderia intervir nas Forças Armadas, que atuavam com orçamento próprio e plena liberdade.

Em 2017, dois anos após a ampla adoção da internet no país, o Exército já tinha um setor com 700 militares responsáveis por uma extensa campanha de desinformação no Face. Controlavam milhares de contas e páginas na rede, dentre elas as de celebridades, pop stars e até a popular Miss Myanmar, Shwe Eain Si, conhecida como SES. A população buscava seus ídolos sem saber que os influenciadores trabalhavam para o Exército, produzindo peças publicitárias de nacionalismo extremo e horror étnico. Em um de seus vídeos, narrado em inglês com legendas em birmanês, com a voz suave e um filtro difusor, SES prega a paz enquanto mostra fotografias falsas, gráficas de um verdadeiro terror, acusando os muçulmanos de ataques bárbaros contra budistas. (Ainda é possível assistir a este vídeo — mas o alerta cabe. É forte. E as acusações nele feitas são comprovadamente falsas.)

Embora não trabalhasse para o Exército, o monge Wirarthu passou a ter uma das páginas de Facebook mais visitadas no país. E ele republicava todos os boatos de violência, pregava que os muçulmanos secretamente controlavam o poder no novo governo, além de serem os donos do dinheiro em Myanmar. Em janeiro de 2017, um dos maiores advogados do país e conselheiro pessoal de Suu Kyi foi assassinado. Era um dos muçulmanos de maior visibilidade. Entre agosto e setembro do mesmo ano, pelo menos três mil pessoas da etnia rohingya foram assassinadas em manobras militares e mais de 800 mil fugiram do país para Bangladesh. Tentando ainda se manter no poder, Syy Kyi calou. Em dezembro a ONU classificou a ação como uma de limpeza étnica. Ou genocídio.

O governo civil nunca se recuperou da crise política aberta ali e dos constantes ataques via Facebook. Em 1o de fevereiro deste ano, caiu perante um novo golpe militar.

Uma das primeiras ações do regime democrático em Myanmar foi ampliar acesso à internet acreditando que, assim, abriria portas para o livre debate na sociedade. Mas quando o Facebook foi adotado espontaneamente como principal plataforma de diálogo, o elo quebrou.

Um estudo da ong jornalística Global Witness mostra o processo. Os investigadores criaram um perfil limpo, sem histórico passado, na rede de Myanmar. Fizeram então uma busca por notícias relacionadas ao Exército — o que qualquer um por lá inevitavelmente faz, tamanho o poder da instituição. No momento em que o primeiro like numa página relacionada aos militares foi dado, começaram a brotar recomendações de outras páginas. Em minutos o perfil antes vazio havia sido completamente dominado por desinformação racista, discurso de ódio e pró-golpe militar. Não é preciso grande esforço, o próprio algoritmo leva qualquer um a este tipo de conteúdo.

Durante a ditadura anterior, os militares acreditavam que se liberassem a internet, perderiam o controle do país. No Face, descobriram no curto período democrático que a internet poderia se tornar sua principal aliada. Com a ajuda da rede conseguiram criar o ambiente de incitação aogenocídio e tornar ao poder.

O monge Wirarthu foi expulso do Face em 2018, alguns meses após o genocídio. Àquela altura, ele já era habitualmente tratado como o ‘bin Laden budista’ pela imprensa internacional fazia muitos anos. Não era uma figura obscura e a natureza de seu discurso tampouco era desconhecida. O Facebook nunca explicou por que não havia tomado qualquer ação nos anos anteriores. Também foram expulsos generais, incluindo o comandante do Exército, num conjunto de 484 páginas, 157 contas e 17 grupos que “atuavam de forma coordenada em comportamento inautêntico”.

Mas, quando um tribunal internacional cobrou do Facebook, em 2020, informações que pudessem ajudar a reconstruir o caminho que o discurso do ódio online tomou para terminar em genocídio, a empresa se negou a entregar. O pedido, de acordo com a empresa, era “excessivamente amplo”. É também “intrusivo e oneroso”. Daria trabalho demais.

O Facebook também não informa quantos funcionários compreendem birmanês e são capazes de avaliar o conteúdo publicado.

No país vizinho

Em agosto de 2020, mais ou menos quando o Face se negava a entregar à Justiça dados que ajudassem a compreender o genocídio rohingya, outro monge budista começou a agir não muito longe de Myanmar. Mas, diferentemente de Wirarthu, Luon Sovath precisou fugir de seu país. O Camboja. Conhecido em todo o país, um ávido defensor dos direitos humanos, Luon Sovath foi vítima de uma campanha massiva de desinformação — ele não ameaçava, era ameaçado. Dentre o material que circulou no Facebook a seu respeito estava um vídeo muito pouco nítido que sugeria relações sexuais suas com uma mãe e as três filhas. Não só estaria violando o juramento de castidade como cometendo algo próximo do incesto num país particularmente conservador. A ameaça se mostrou tão relevante que ele teve de deixar o país.

O Camboja é uma ditadura e vem sendo governado, desde 1985, pelo primeiro-ministro Hun Sen, um homem de 69 anos que atuou como soldado durante o genocídio promovido pelo Khmer Vermelho durante a década de 1970. Assim como em Myanmar, por lá a internet é, em essência, o Facebook. A plataforma que todos usam. E, assim como as Forças Armadas de Myanmar, o governo tem um departamento dedicado a produzir conteúdo falso para a rede.

No caso de um dos vídeos envolvendo o monge Luon Sovath, repórteres do New York Times descobriram indícios ligando o material a dois funcionários deste departamento de propaganda.

Advogados de políticos da oposição, nos EUA, tentam já há três anos conseguir dados sobre a compra de publicidade no Facebook, para divulgação de conteúdo pró-governo. Um conjunto de e-mails vazados em 2017 sugerem que, por dia, o Estado gastava US$ 15 mil por dia para atrair visitas para suas páginas. Num país com 15 milhões de habitantes, a página do premiê tem quase 14 milhões de seguidores. Em sua campanha mais recente online, Hun Sen vem promovendo uma campanha de ‘moralização’ das mulheres que usam roupas ‘reveladoras’ online.

Morte africana

O cantor pop Hachalu Hundessa dirigia seu carro, no dia 29 de junho do ano passado, quando um homem se aproximou, disparou e o matou em um bairro periférico de Addis Ababa, capital da Etiópia. Hundessa tinha 34 anos e, por toda vida, alternou a militância política com a carreira de músico. Foi preso aos 17 por sua defesa de autonomia para o povo Oromo, ao qual pertence, e permaneceu nas cadeias da ditadura etíope por cinco anos. A carreira musical veio depois — “ele compôs a trilha sonora da revolução Oromo”, explicou um professor da Universidade Keele, na Inglaterra. “Um gênio lírico que incorporou as esperanças e aspirações do povo.”

Segundo a polícia, o assassino pertencia a sua etnia. O rapaz matou Hundessa porque o cantor se aproximara do premiê Ahmed Abiy, também Oromo, e que hipernacionalistas criticavam por contemporizar com outros grupos. Imediatamente após o assassinato, o Facebook se incendiou em acusações diversas, boatos e incitação. Nas horas seguintes, hordas tomaram as ruas da capital etíope. Propriedades foram destruídas e incendiadas. Houve uma série de linchamentos que terminaram com decapitações públicas.

Apenas um ano antes, em 2019, o corredor etíope Haile Gebreselassie tentou usar sua fama internacional para chamar atenção para outra explosão de ódio na região de Oromia. Ela deixou 81 mortos após informações falsas circularem no mesmo Facebook de que grupos rivais estavam sendo armados para ataques. Gebreselassie, recordista mundial de maratonas em 2008, foi ouvido na época por toda imprensa.

Em 2020, o Facebook dizia ter uma equipe de 100 pessoas responsáveis pela moderação de conteúdo no continente africano. Não revelava quantos compreendiam algum dos mais de 50 dialetos falados na Etiópia. Durante as eleições que ocorreram em junho deste ano no país, a empresa diz ter contratado falantes nativos de oromo, amharic e somali, que de fato são os troncos linguísticos mais importantes. Não afirmou quantos. Entre março e março, de 2020 a 21, o Face afirma ter retirado mais de 87 mil postagens de desinformação no país. O arco cultural do continente africano abarca mais de duas mil línguas.

O ponto

Com muita frequência, o que se publica a respeito de desinformação nas redes sociais trata de Estados Unidos, Europa, ou alguns outros países como o Brasil. O Brasil, noves fora a baixa autoestima local, é um país rico e importante na geopolítica mundial. Por conta de Jair Bolsonaro, tornou-se também um dos focos da imprensa internacional atenta ao drama da recessão democrática que ocorre no mundo.

Myanmar, Camboja, Etiópia e tantos outros não são foco. Em países como estes, as línguas faladas são pouco relevantes na economia mundial. Ninguém as fala com exceção de quem as tem como línguas maternas. Tensões étnicas não são novas em nenhum destes lugares. Ódio, autoritarismo ou violência muito menos. A história é longa. A diferença é a velocidade — de uma hora para a outra, pelas redes, boatos são espalhados espontaneamente ou por meio de uma máquina organizada para isto — e uma explosão se dá.

O Facebook já tem pelo menos um genocídio com seu nome.

A questão é simples: o algoritmo faz discurso de ódio circular com facilidade. Ele, o algoritmo, desmontou como a internet funcionava. Antes, pessoas precisavam buscar a informação que consumiriam. O algoritmo leva informação a elas. A nós. E, invariavelmente, é o tipo de material que atiça conflito. Assim como campanhas presidenciais como as de Jair Bolsonaro e Donald Trump utilizaram a ferramenta para ampliar o impacto de suas mensagens, outros movimentos autoritários no mundo já dominaram a técnica.

E a usam livremente. Muitas vezes, sem os holofotes da imprensa.

 

 

Fonte da Imagem: The Phantoms of the Brain by richworks on DeviantArt

domingo, 6 de setembro de 2020

OS ENGENHEIROS DO CAOS

 


Se você quiser saber como as Fake News, as Teorias da Conspiração e os Algoritmos estão sendo utilizados para disseminar ÓDIO, MEDO e influenciar ELEIÇÕES, a leitura do livro “OS ENGENHEIROS DOS CAOS”, de Giuliano Da Empoli, é fundamental.

Você vai entender perfeitamente como figuras improváveis, como Bolsonaro e Trump, tiveram sucesso eleitoral.

A seguir pequeno trecho do livro, para degustação:

““Somos criaturas sociais, e nosso bem-estar depende, em boa parte, da aprovação dos que estão em volta. Ao contrário de outros animais, o homem nasce sem defesas e sem competências e continua assim por muitos anos. Desde o início, sua sobrevivência depende das relações que ele consegue estabelecer com os outros. O diabólico poder de atração das redes sociais se baseia nesse elemento primordial. Cada curtida é uma carícia maternal em nosso ego. A arquitetura do Facebook é toda sustentada sobre a nossa necessidade de reconhecimento, como admite, tranquilamente, seu primeiro financiador, Sean Parker.

“Nós fornecemos a você uma pequena dose de dopamina, cada vez que alguém o curte, comenta uma foto ou um post, ou qualquer outra coisa sua. É um loop de validação social, exatamente o tipo de coisa que um hacker como eu poderia explorar, porque tira proveito de um ponto fraco da psicologia humana. Os inventores, os criadores, eu, Mark [Zuckerberg], Kevin Systrom, do Instagram, estávamos perfeitamente conscientes disso. E, mesmo assim, fizemos o que fizemos. E isso transforma literalmente as relações que as pessoas têm entre si e com a sociedade como um todo. Interfere provavelmente na produtividade, de certa maneira. Só Deus sabe qual o efeito que isso produz no cérebro de nossos filhos.”

Bem antes dos Bannon e dos Casaleggio, há o trabalho dos aprendizes de feiticeiro do Vale do Silício. O maquinário hiperpotente das redes sociais, suspenso sobre as molas mais primárias da psicologia humana, não foi concebido para nos confortar, mas, pelo contrário, veio à luz para nos manter num estado de incerteza e de carência permanente. O cliente ideal do Sean Parker, de Zuckerberg e de todos os outros é um ser compulsivo, empurrado por uma força irresistível para voltar à plataforma dezenas, centenas, milhares de vezes por dia, fissurado por essas pequenas doses de dopamina da qual se tornou dependente. Um estudo americano demonstrou que, em média, cada um de nós dá 2.617 toques por dia na tela de nosso smartphone. Sem dúvida, não é o comportamento de uma pessoa que esteja sã de espírito. Está mais próximo do modo de agir de um junkie em fase terminal, que se “aplica”, ao longo do dia, seguidas doses de refresh e de likes.””

 

Agradeço ao amigo Dr. Junico Antunes pela indicação e ao meu filho Henrique Zasso Rösler pela digitação.

 

Omar. 

Setembro de 2020 

 

Fonte da Imagem: https://br.pinterest.com/pin/674554850408950152/

domingo, 19 de agosto de 2018

Facebook y la batalla por nuestro tiempo

 

Las fichas que mueve Facebook para revertir el escándalo de Cambridge Analytica.


La conferencia anual de Facebook para desarrolladores (F8) recibió una previsible atención especial este año, en medio de la peor crisis de la compañía. Pero con excepción de la apertura de Mark Zuckerberg, el evento siguió su propia agenda. Un dato indicativo de que los cambios recientes en las políticas de privacidad -incluida la adopción del protocolo europeo GPDR- tienen un alcance superficial, aunque nada de esto permitió revertir la cuesta arriba de la compañía tras el escándalo de Cambridge Analytica. Un análisis de los nuevos anuncios a la luz de los debates más actuales sobre los usos de las tecnologías, que involucran a otros gigantes como Google y Apple.

Time well spent -de traducibilidad múltiple: tiempo bien gastado, bien usado o bien invertido- es un concepto promovido por Tristan Harris, quien paradójicamente ostentó el título de diseñador ético en Google y abandonó la compañía en 2016, en aras de combatir la “crisis de atención digital” provocada deliberadamente por los gigantes de Internet y las nuevas tecnologías. A estos efectos creó una fundación llamada Centro por una Tecnología Humana, escribe artículos, imparte charlas TED, organiza actos y otros eventos, mientras sus seguidores se multiplican en todo el mundo -lo que se dice todo un militante (no sólo) 2.0. Entre sus laderos se cuentan otros renegados como el ex asesor de Facebook Roger McNamee, en sintonía con las impactantes declaraciones que en su momento hizo Chamath Palihapitiya, otrora importantísimo ejecutivo, cuando confesó su arrepentimiento por contribuir a desarrollar una herramienta que está “desgarrando el tejido social”.

En enero de este año, casi una eternidad antes del affaire Cambridge Analytica, Zuckerberg utilizó el eslogan pergeñado por sus detractores para fundamentar un cambio de orientación en su plataforma -que ya venía siendo sacudida por su responsabilidad en la difusión de las famosas fake news. ¿Se trató de un gesto genuino o de una apropiación cínica con fines espurios? Ante una creciente sensación de aburrimiento, hastío y hasta culpa que se apodera de nuestra experiencia digital, los nuevos algoritmos pretenden favorecer las “interacciones significativas”, reemplazando criterios puramente cuantitativos. El objetivo no es otro que retener a los usuarios. Las medidas dirigidas a aplacar la desconfianza hacia las políticas de privacidad también deben ser entendidas en esta clave. La diferencia con la propuesta de Harris es sutil pero gigantesca. Según la publicación especializada The Verge, este promete ser el próximo gran debate en el ámbito de la tecnología.

Lo que se viene

Las crecientes reservas de los usuarios sobre Facebook se vieron traducidas ya en importantes consecuencias económicas. Es que en el segundo trimestre de 2018 la cantidad de usuarios mensuales activos subió en ese período un 11% hasta alcanzar los 2.230 millones, menos de los 2.250 millones esperados. Con esos malos resultados sus acciones de la compañía cayeron casi un 19%: fue la peor jornada desde que juega en la Bolsa.

Bajo esta luz podemos considerar la lista de novedades difundida a partir de F8, la conferencia anual dedicada a exponer los proyectos de innovación más audaces y las nuevas perspectivas de negocios, que tuvo lugar en abril. En algunos casos, se trata de recortar distancia a la competencia en rubros donde Facebook corre con desventaja. ¿Se viene otro caso Snapchat? Sus creadores se negaron a ser absorbidos por Zuckerberg, tras lo cual su aplicación se vio aplastada mediante la imitación de sus originales stories primero en Instagram (que pertenece a Facebook), luego en Facebook, y finalmente en WhatsApp (que también pertenece a Facebook).

WhatsApp permitirá conferencias, buscando ganar terreno en un ambiente corporativo donde corre de atrás contra Skype y Google Hangouts, además de “unir” familias y amigos dispersos por el globo. También en este sentido, pero más impresionante, es la incursión en el mundo de las citas.

Allí el liderazgo pertenece a Tinder, que también es dueño de la pujante OkCupid, entre otros jugadores relevantes como Bumble, Happn o Badoo. La apuesta de Facebook Datings se valdrá significativamente de la cuantiosa información que posee de los usuarios, pero el objetivo no es derrotar a Tinder, en ese caso podría haberla comprada o imitado: la apuesta de Zuckerberg será por la generación de “relaciones de largo plazo”. Muchos dicen que se inspira en una app menos conocida, llamada Hinge. En Facebook Datings, como en Hinge, parece que los solteros podrán iniciar conversaciones no simplemente diciendo “hola”, sino comentando un elemento de perfil específico.

En cuanto a la privacidad, dicho sea de paso, el principal anuncio había sido anticipado en ocasión del control de daños efectuado semanas atrás, sobre la posibilidad de eliminar el propio historial. La función es accesible con un simple botón, aunque existen serias dudas respecto del grado de realidad de esa eliminación: ha adquirido estado público la existencia de shadow profiles hasta para personas que nunca abrieron una cuenta.

En otro orden, un rediseño de Messenger para hacerla más simple y ágil apunta a facilitar la interacción entre usuarios y empresas, las cuales de hecho podrán empotrar una pestaña de la aplicación directamente en sus propios sitios web. Instagram incorpora más interacción con otras aplicaciones como Spotify y nuevos efectos de realidad aumentada. El lanzamiento del dispositivo Oculus Go apunta a masificar el mercado de la realidad virtual, digamos, buscando imitar la asociación del producto a la marca como logró en su momento Apple con iPod y iPhone. Oculus abre nuevas vetas de recolección de datos: permitirá ver Netflix y otros eventos, además de explotar el universo gamer, marcadamente consumista.

Otras aplicaciones se acercan aún más al nuevo objetivo de interacción significativa que, siguiendo al padre del marxismo ruso Georgi Plejánov (“El propagandista comunica muchas ideas a una sola o a varias personas, mientras que el agitador comunica una sola idea o un pequeño número de ideas, pero, en cambio, a toda una multitud”), intenta ser más propagandística que agitativa en lo que respecta a la experiencia del usuario. La función Watch Party permitirá observar videos, incluyendo transmisiones en vivo de eventos deportivos y culturales, en forma simultánea por parte de grupos cerrados. Como juntarse a ver la tele. En el mismo sentido, los grupos de amigos tendrán más prioridad en el newsfeed que hasta ahora.

Tomadas estas medidas en conjunto, el objetivo claro es seguir absorbiendo espacios cada vez más amplios y relevantes de la sociabilidad, ya sea ganándolos a la competencia o a situaciones “analógicas”. Reuniones de trabajo, la seducción, ¡juntarse a ver un partido de fútbol o un recital!, todo transita de la realidad física a la realidad virtual. Y todo es monetizable. En este punto no está de más recordar que Facebook está en el ojo de la tormenta por un fenómeno que involucra a otros pesos pesados como Google y Apple.

El impacto del diseño

La pregunta que importa, desde el punto de vista de la filosofía time well spent, es si todo esto fomenta o previene los comportamientos adictivos. La respuesta es obvia. La competencia por nuestra atención está en el núcleo del problema de las plataformas digitales.

Joe Edelman, una suerte de espada teórica del movimiento, enfatiza -más allá de la cantidad de tiempo dedicada a los dispositivos- la contradicción entre nuestros valores y los hábitos promovidos por las aplicaciones, lo cual explica la angustia experimentada después de usarlas. Hay contraejemplos positivos: Wikipedia y Couchsurfing, entre otros, están validados por la valoración de los usuarios, pues habilitan prácticas alineadas a sus valores.

Actuar de acuerdo a nuestros valores, dice Edelman, puede verse favorecido o no por los ambientes en los que nos movemos, de acuerdo a las normas que ordenan el comportamiento. Pero esta normatividad, de facto o de iure, no sólo es variable en el tiempo y el espacio, y flexible en su interpretación, sino que las reglas siempre pueden ser incumplidas -y su transgresión puede hasta ser un medio para una subjetivación exitosa-. Esto no pasa en todos los medios sociales virtuales. Allí las normas fijadas en el diseño tienen la fuerza de una ley natural: no pueden ser quebradas ni dobladas. Otro aspecto del constreñimiento social a nuestras prácticas es la estructuración del espacio, pero este también puede ser transgredido. Lo que no se puede es grafitear el muro de Facebook. La instancia decisiva, entonces, es la del diseño mismo del software.

Desde este punto de vista, es difícil relacionarse de manera original con las plataformas de sociabilidad virtual. Aún así, crecen las comunidades que alientan patrones de conducta menos patológicos. Un fenómeno que recibe mucha atención es el de los llamados nativos digitales. Los abordajes más banales dan por sentado un manejo pleno de las TIC por los más jóvenes y al mismo tiempo se sorprenden por el bajo rendimiento educativo, asociado a dificultades en la atención como producto de la abundancia de estímulos. El complemento perverso del argumento es el dopaje en masa de niños y adolescentes para beneficio de los pulpos farmacéuticos. Algunos trabajos más serios, como el recientemente publicado libro de Mariana Maggio, Enriquecer la enseñanza, avanzan sobre el fino sendero que hay entre la tecnofobia y el fetichismo TIC: los entornos digitales actuales tienen un gigantesco potencial educativo, pero las competencias para acceder, seleccionar y procesar la información están mediadas y deben ser estimuladas por la práctica de la enseñanza, no asumirlas como algo dado. En otras palabras, favorecer ciertos usos que no vienen por default, y de hecho, son relativamente disruptivos de aquellos más intuitivos que el diseño del software nos induce a naturalizar. Dicho esto, el impacto cognitivo es indudable -lo cual, insistimos, no se soluciona dopando menores de forma indiscriminada- y se extiende a los “inmigrantes” digitales.

Saber cuando parar

Una conclusión que no siendo hegemónica tiene gran popularidad redunda en el rechazo a las nuevas tecnologías porque reducirían ciertas atribuciones intelectuales. Esto recuerda la crítica que Platón hacía en el Fedro a la escritura -que es, después de todo, la más antigua tecnología de la información y la comunicación. La vigencia de este argumento va a contracorriente de desarrollos recientes en la historia del conocimiento. Bruno Latour ha puesto de manifiesto, reuniendo aportes diversos, la importancia de las técnicas de representación en la determinación de los grandes saltos cognoscitivos.

La invectiva platónica fue invertida por el filósofo francés Bernard Stiegler, que establece la mediación de dispositivos para la fijación de ideas como una condición para el ejercicio de la razón, pero extiende su alcance a la constitución misma de la subjetividad humana valiéndose de un concepto de cuño derrideano: la farmacología. En rigor, su densidad teórica da para mucho más que lo que podemos esbozar aquí, pero vale guiarse por un ejercicio de asociación simple. La tecnología, como los fármacos (y las drogas), no es mala en sí, pero hay que saber cuando parar.

La mención que hacemos no es casual: Stiegler encabeza el colectivo Ars Industrialis, que promueve “una política industrial de las tecnologías del espíritu”. Una traducción tentativa al criollo: la convergencia de las industrias asociadas a lo audiovisual, las telecomunicaciones y la informática en el espacio digital, en la medida en que se encuentran sujetas a criterios de mercado producen sociedades de control y una crisis de los deseos que debe ser superada mediante nuevas formas de relacionamiento con estas tecnologías, que emergerían de una producción “ecológica”. Sin ahondar más en las profundidades de la tradición filosófica francesa, vamos a valernos de la crueldad de las comparaciones: se trata de un Center for Humane Technology menos mainstream (y europeo).

Los activismos de Harris y Stiegler se mueven en un frente de batalla distinto, aunque complementario, al de los críticos del “extractivismo de datos” como Evgeny Morozov o el más afamado Edward Snowden. Los aportes de estos últimos han puesto de manifiesto, mucho antes de que Cambridge Analytica estuviera en el radar de nadie, los alcances lesivos para la democracia y las libertades individuales del modelo de negocios de los gigantes de Internet.

La relación entre uno y otro aspecto es evidente. Continuando con la metáfora farmacológica, la interpretación tecnofóbica de estos asuntos es asimilable al prohibicionismo. Como siempre, la analogía tiene su límite: sin el poder de fuego de la Administración para el Control de Drogas estadounidense, antes que contraproducente se trata de un planteamiento condenado a la marginalidad. En vez de propugnar políticas condenadas al fracaso, los críticos del actual estado de cosas haríamos bien en promover usos y, por qué no, también diseños que sean alternativos.

Entretanto, el 1º de agosto, Ameet Ranadive, director de Gestión de Producto en Instagram, y David Ginsberg, director de Investigación en Facebook, volvieron a dejar en claro que el intento de apropiarse del lema de time well spent va en serio, al anunciar nuevas herramientas que servirán para controlar la cantidad de tiempo que los usuarios gastan en las plataformas. Sin embargo, Larry Rosen, un psicólogo investigador de la Universidad Estatal de California que estudia las consecuencias adictivas de este tipo de tecnología, ya alertó sobre el posible fiasco. Rosen usa una aplicación llamada Moment en su investigación, que sirve para calcular la cantidad de horas invertidas de manera similar al tablero de actividad que Ranadive y Ginsberg anunciaron para Facebook e Instagram. Rosen advirtió que las personas no usan sus teléfonos significativamente menos después de rastrear el número (a menudo impactante) de horas que pasan desplazándose. A la luz de ello, el time well spent de Facebook se parece mucho a la hipocresía.
Fonte: https://findesemana.ladiaria.com.uy/

segunda-feira, 4 de junho de 2018

INTERNET: "PARA SUA PROTEÇÃO..."

 

Paul Demarty

01/06/2018

Es bastante raro que todo el mundo se de cuenta de pronto de la existencia de alguna legislación abstrusa de Bruselas, pero solo los ermitaños habrán podido ignorar la plaga de correos electrónicos casi idénticos que hemos sufrido en la última semana o dos: todos citando, aunque disculpándose, la normativa de protección de datos generales (GDPR ).

Esta regulación, que ha causado todo este lío, es un intento de unificar las medidas de protección de datos de la Unión Europea ya existentes y reforzar su aplicación. Se han impuesto restricciones sustanciales a la recopilación de información de los usuarios, especialmente 'información de identificación personal' (PII). La multa máxima para las violaciones más graves es de 20 millones de Euros y el 4% de los ingresos anuales totales de la empresa infractora. Se trata de una suma llamativa, y hacen que la regulación valga el esfuerzo.

No es que los usuarios fueran a saberlo. Porque, si bien, desde el más insignificante boletín de correo electrónico hasta Facebook y Google, hemos sido testigos de una orgía de excusas, todo el asunto ha sido un caos total. Mark Zuckerberg, de Facebook, se negó a responder directamente a los eurodiputados sobre si su empresa cumple por completo esta legislación; en todo Silicon Valley y Londres Este y Berlín, se cruzaron dedos cuando la ley entró en vigor el 25 de mayo Algunas empresas estadounidenses simplemente han dejado de dar servicio a sus clientes en la Unión Europea (existe cierta controversia sobre hasta que punto hay que endurecer la purga de europeos de sus sitios con el fin de adaptarse a la regulación). En particular, todo un grupo de periódicos, incluyendo el Chicago Tribune, han dejado de ser accesibles desde las direcciones IP europeas.

No podemos culpar del todo a la UE de ello. El texto de la ley se acordó hace dos años, y es obligación de las empresas prestar atención a los cambios en el entorno regulatorio. La diferencia entre el mundo como era entonces - cuando esa regulación era tan inimaginable que la gente simplemente no se la tomaba en serio - al actual tras ser promulgada, es un importante cambio en la historia de Internet.

El que la industria de la tecnología llore y cruja sus dientes sobre todo esto, no puede ser interpretado más que como una herida auto-infligida en su totalidad. El GDPR debe resolver dos problemas ante todo. El primero es la recurrente violación catastrófica de datos, que supone una enorme ventaja para los ladrones de identidades electrónicas de todo el mundo. Los acontecimientos recientes han confirmado la necesidad de algún tipo de marco para obligar a la gente a cumplir con sus responsabilidades como custodios de los derechos de privacidad ignorados de forma sistemática. Basta pensar en el escándalo de Equifax el año pasado, que puso en peligro las identidades de la inmensa mayoría de la población estadounidense. Equifax ha conseguido escapar prácticamente impune de esta calamidad. La otra cara del problema es la avaricia extraordinaria de datos de comportamiento exhibida por las principales compañías de Internet y sus competidores rivales. El problema no ha hecho más que agravarse desde hace dos años cuando se aprobó la GDPR, con el escándalo de Cambridge Analytica y otros parecidos.

Hay una imagen popular - o por lo menos bastante extendida - de que Internet es un espacio de libertad salvaje y anárquica. El supuesto anarquista Peter Lamborn Wilson, que en su existencia como místico sufí New Age se hace llamar Hakim Bey - definía Internet, entonces en sus primeros pasos, como la último de una larga lista de “utopías piratas”: zonas temporalmente autónomas, donde la gente puede disfrutar de una ráfaga de libertad, aunque este rodeada por un mundo deshumanizado y racionalizado. A pesar de toda la palabrería sufí, los paradigmas de Wilson son muy americanos, de una manera bastante tradicional. Jack Kerouac en su novela En el camino lleva a su héroe a San Francisco a la búsqueda de la autenticidad personal; ahora la búsqueda ha sido domesticada desde su forma salvaje y desafiante de macho-alfa de la generación Beat y transformada en la respuesta standard de cada departamento de marketing del universo, según la cual la auto-realización completa está al alcance de la mano con un frasco de suplementos vitamínicos.

Lo que no ha cambiado es el destino: California, de la que emana la cultura de masas de Internet en su versión más agresiva. Gran parte del lenguaje de la industria de las tecnologías de la información deriva del mito del oeste americano. De hecho, el grupo más importante de defensa de derechos de los usuarios de Internet en los Estados Unidos es la Electronic Frontier Fundación. La autosatisfacción de los autoproclamados ‘pioneros' tecnológicos ha llegado a ser ensordecedora. Y si hay algo que los vaqueros “libres” odian, es la ley.

Ponis de un solo truco

Lo que ponen de manifiesto los recientes problemas de Facebook y similares - y lo que la GDPR pone de relieve aún más - es que los gigantes de Internet no son tan terriblemente innovadores después de todo. Resulta que un buen número de ellos han estado acumulando beneficios gracias a un truco barato: espiando de manera intrusiva a sus usuarios y alimentando con sus datos sistemas informáticos con capacidad de aprendizaje autónomo. En su gran mayoría, los resultados que producen estos sistemas - a pesar de la habladuría sobre las ciudades inteligentes y los coches sin conductor - están destinados a dirigir la publicidad hacia grupos específicos. Las respuestas orientadas, el cabildeo incesante, la avalancha de relaciones publicas dan testimonio de este hecho: Facebook y Google no están principalmente involucradas en hacer algo interesante: actuar simplemente - como un libro reciente sobre ellas revela - como “comerciantes de atención”. (1)

La publicidad en internet es un mundo de pequeños márgenes. El espacio publicitario peligrosamente casi no tiene valor - y los márgenes, por muy pequeños que sean, son esenciales. Facebook y Google compiten en como dirigir los anuncios hacia los usuarios con mayor disposición para aceptarlos. Y esta selección debe hacerse de forma automática, para tener la oportunidad de llegar a sus miles de millones de usuarios, y hacerlo rápidamente. Eso implica construir los sistemas de aprendizaje automático antes mencionadas - o, muy a menudo, su compra mediante la adquisición de nuevas empresas más pequeñas de inteligencia artificial en sus inicios. El problema con el aprendizaje informático es que las máquinas no aprenden con demasiada facilidad. Imagine un niño de corta edad: ve una ardilla por primera vez. Sus padres le dicen: 'Es una ardilla'. Si ve dos o tres ardillas más, será capaz de reconocerlas instintivamente toda su vida. Incluso los sistemas de aprendizaje automático más sofisticados, sin embargo, requieren mucho más ejemplos fiables antes de poder hacer juicios correctos de este tipo. De ahí la avaricia de datos.

La segunda causa no es tan inocentemente 'técnica'. A los apologistas de Silicon Valley y sus imitadores les gusta señalar al mundo de las empresas start-up como una señal de su gran potencial vivificador de un capitalismo claramente en decadencia. Si analizamos como triunfa en realidad una nueva empresa de este tipo respaldada por capital de riesgo, encontramos algo muy diferente: monopolios. Los inversores quemarán dinero durante años sólo si la recompensa va a ser gigantesca, y este tipo de beneficios solo pueden conseguirse de dos formas esencialmente. Una: la empresa consigue un monopolio inatacable sobre algún mercado. Dos: la empresa es adquirida por una empresa ya establecida en el sector por encima de su valor, reforzando la posición de monopolio del titular.

Esto sólo funciona, por supuesto, si una empresa es defendible - es decir, algo bloquea la puesta en marcha de otra empresa innovadora similar, pero cinco centavos al mes más barata, y después otra y otra. Aquí es donde los grandes datos aparecen en escena - junto con las limitaciones técnicas de los actuales sistemas de inteligencia artificial, siendo los primeros, y consiguiendo una gran cantidad de usuarios de forma rápida, en un mercado en el que la IA proporciona una ventaja lo suficientemente dramática como para asegurar una posición de monopolio.

Atraer la atención de los reguladores no era parte del plan, pero era bastante inevitable. Es difícil reprimir una sonrisa ante las dificultades actuales de las empresas monopolistas de internet, cuando su poco transparente modelo de negocios se enfrenta a su primer desafío serio. Ciertamente, cuando se trata de la cuestión de las infracciones de datos, no hay una menor necesidad de la supervisión normativa seria que la que existe - por ejemplo - sobre la higiene alimentaria. Demasiadas empresas han expuesto a millones de personas al riesgo de un fraude a gran escala y se les deja escapar con un mero tirón de orejas en la prensa tecnológica.

Servir a la sociedad

Los problemas con la GDPR tienen su origen en el otro 50% de su objetivo regulatorio: la cuestión de la privacidad. Estamos hablando, después de todo, de una regulación que es sucesora directa del famoso 'derecho al olvido', gracias al cual las personas pueden solicitar a Google que retire resultados desfavorables de búsqueda sobre ellos. Vale la pena señalar que la Cámara de los Lores insertó una enmienda a la Ley de Protección de Datos, que traspasa la GDPR al derecho británico, que permitiría a las personas hacer solicitudes de acceso a los periódicos, obligándoles a entregar toda la información en su poder sobre ellas, acabando de un plumazo con las fuentes anónimas (el gobierno puso reparos, en deferencia a la sensibilidad de sus amigos de la prensa, y la ley no recogió dicha enmienda). No podemos ni imaginar lo que el montón de lacayos pro-sistema y burócratas de toda calaña que son los Lores querían poder 'olvidar' como un derecho ...

A pesar de las enmiendas que recortaron sus peores excesos, la ley parte de premisas lamentables. Como es habitual en la sociedad burguesa, lo que es muy apreciado es el derecho a ser dejado en paz - 'olvidado', de hecho. La palabrería tecno-utópica sobre la anarquía en internet tiene su parte de verdad, que es que la aparición de internet impuso una dosis no deseada de transparencia en aparatos poderosos que no estaban acostumbrados a no silenciar a sus críticos. Mientras no se entendió cómo controlar las cosas, las cosas no fueron controladas eficazmente; todo tipo de travesuras altamente productivas siguieron siendo posibles.

Hay un cierto matiz en el pánico moral sobre Facebook y similares que les deslegitima, en la medida en que permiten contenidos que no son del agrado de sus principales críticos. El problema son los 'trolls' rusos, no los activistas pro-Obama, cuando se trata de explotar las capacidades de clasificación de Facebook de manera más o menos idéntica. No podemos, por supuesto, esperar que los monopolistas de Internet reaccionen de verdad: no pueden ganar dinero con ello. Google y Facebook han llegado a acuerdos muy satisfactorios con regímenes autoritarios mientras olían que habría dinero por medio, lo que no les impedía, al mismo tiempo, presumir de ser el caballo de Troya de la democracia, o cualquiera que sea la metáfora favorita de los idiotas neoliberales hoy en día.

Estamos perdiendo, por consiguiente, ese momento primordial de libertad resultado del salto dialéctico de la capacidad comunicativa de la raza humana en los últimos 20 ó 30 años. Lo qué haríamos bien en desechar junto con esa pérdida es el mito de que tal transformación tecnológica hará el trabajo por nosotros en el plano social. Hay quienes cacarean que la descentralización de las redes sociales y de servicios similares es 'la respuesta' al capitalismo vigilante y al monopolio de los medios digitales. Y en buena medida se solapan con los entusiastas de las criptomonedas, y ambas perspectivas son erróneas por la misma razón. No se puede diseñar, a nivel de software o hardware, un mundo verdaderamente libre. La tecnología está al servicio de la organización social, no es su ama.

Notas:

1) T Wu, The attention merchants: the epic scramble to get inside our heads London 2016.

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Facebook, o novo espelho de Narciso

Vênus Adormecida, de Giorgione

As mulheres estão se tornando maioria nas redes interativas; a vaidade e a necessidade de afirmação da identidade podem explicar o interesse feminino por esse recurso tecnológico

 por Isabelle Anchieta

As mulheres gastam mais do que o dobro do tempo dos homens no Facebook: três horas por dia, enquanto eles gastam uma hora, em média. Entrar na rede social é a primeira ação diária de muitas delas, antes mesmo de irem ao banheiro ou escovarem os dentes. Uma atividade cumprida como um ritual todos os dias – e noites. Em um estudo, 21% admitiram que se levantam durante a noite para verificar se receberam mensagens. Dependência? Cerca de 40% delas já se declaram, sim, dependentes da rede. Elas são a maioria não só no Facebook (onde representam 57% dos usuários); também têm mais contas do que os homens em 84% dos 19 principais sites de relacionamentos.
Essas são algumas revelações da pesquisa feita pelas empresas Oxygen Media e Lightspeed Research, que analisou os hábitos on-line de 1.605 adultos ao longo de 2010. Mas cabe ainda perguntar: que motivos levam as mulheres a ficar tanto tempo na frente do computador? Vaidade? Necessidade de reconhecimento? Seria esse fenômeno uma nova forma de autoafirmação? Uma maneira de desenvolver sua individualidade aliada ao reconhecimento do outro? Será essa uma nova forma de buscar sociabilização?

Mais do que procurar uma resposta fácil, cabe, antes, compreender por que a auto-representação é mais importante para as mulheres que para os homens. Historicamente as representações femininas foram fabricadas por motivações sociais diversas: míticas, religiosas, políticas, patriarcais, estéticas, sexuais e econômicas. E, há mais de vinte séculos, essa fabricação esteve sob o poder masculino. As mulheres não produziam suas próprias imagens, eram retratadas.

Em obras de arte célebres vemos inúmeras Vênus adormecidas, (como as de Giorgione, 1509; Ticiano, 1538 e Manet, 1863); Madonas castas (nas imagens religiosas das catedrais católicas como as pintadas por Giotto, no século13, e Botticelli, no 15) ou mulheres burguesas no espaço doméstico cuidando da cozinha e da educação dos filhos (como as pintadas por Rapin e Backer no século 19). Eram cenas “pedagógicas”, que ensinavam o valor da maternidade, da castidade, da beleza e da passividade.

O pano de fundo dessas produções artísticas era uma tentativa masculina de “gerenciar” o imaginário feminino, transmitindo sugestões sobre a conduta social desejada até uma estética sexual e familiar. Como enfatiza a historiadora Anna Higonnet “os arquétipos femininos eram muito mais do que o reflexo dos ideais de beleza; eles constituíam modelos de comportamento”. Sua capacidade de persuasão era ativada pelo contexto cultural. Um exemplo pontual, mas significativo, pode ilustrar essa hipótese. O nu é quase sinônimo do “nu feminino”. Do Império Romano, passando pelo Renascimento, pela Modernidade e até os dias de hoje, o corpo da mulher reflete os ideais estéticos predominantes.

A historiadora francesa Michelle Perrot chegou a afirmar que “a mulher é, antes de tudo, uma imagem”. Aqui sua ênfase é irônica. Refere-se a uma forma de retratar que associava os cuidados com o corpo, os adornos, as vestimentas e a beleza em geral à atividade, ou melhor, à ociosidade tipicamente feminina”, enquanto os homens deveriam se ocupar de tarefas consideradas sérias: política, economia e trabalho.

Quando a era moderna pareceu, enfim, trazer a emancipação da mulher, a conquista revelou-se contraditória. Estar na moda, ser magra, bem-sucedida e boa mãe tornou-se uma exigência. Com a ajuda do photoshop, top models, estrelas de televisão e cantoras exibem nos meios de comunicação o êxito que conquistaram em todos os aspectos do sucesso – o que, na prática, nem sempre é verdade. Elas, em geral, são tão “irreais” quanto a Vênus grega. A verdade é que a mídia veicula uma série de estereótipos sobre como agir que se tornam um peso para a mulher. Não devemos nos esquecer de que quem assume o comando é o mercado interessado em vender roupas, revistas e produtos destinados ao público feminino – e não propriamente a mulher. Assim, mesmo no século 20, quando pareciam ganhar “autonomia”, elas passaram a ser atormentadas por padrões estabelecidos por outra base imaginária: a do consumo.

O que muda no século 21 para as mulheres que utilizam as redes sociais? Quanto à importância da imagem, nada. Ela -continua a ter papel central para a identidade social feminina, confundindo-se com ela. Por outro lado, vivemos, sim, uma revolução: pela primeira vez a mulher passa a se autorrepresentar, a produzir representações de si publicamente. Essa produção não está mais sob o domínio exclusivo dos homens, nem restrita a um grupo de mulheres como as artistas (atrizes, fotógrafas, cineastas, pintoras, escultoras etc.) ou as modelos. As mulheres comuns tornam-se protagonistas de sua vida. Chegam a dispensar a ajuda de outra pessoa para tirar a própria foto: estendem o braço e miram em sua própria direção. Algumas marcas de câmeras fotográficas desenvolveram inclusive um visor frontal para que a pessoa possa ajustar o foco caso use o equipamento para se fotografar.

A mulher “hipermoderna” reivindica algo novo: o seu protagonismo público e sua “autenticidade”. O que se soma, agora, à revolução tecnológica da sociedade capitalista. Com acesso facilitado a câmeras digitais, a telefones móveis que dispõem desse equipamento e à rede, além da existência de uma plataforma que dá suporte ao armazenamento e oferece possibilidades ao usuário para compartilhar essas imagens pela internet, a mulher passa a se autofotografar nas mais diversas ocasiões, de situações corriqueiras a viagens. Nas palavras do filósofo Gilles Lipovetsky: “O retrato do indivíduo hipermoderno não é construído sob uma visão excepcional. Ele afirma um estilo de vida cada vez mais comum, 'com a compulsão de comunicação e conexão', mas também como marketing em de si, cada um lutando para ganhar novos 'amigos' para destacar seu 'perfil' por meio de seus gostos, fotos e viagens. Uma espécie de autoestética, um espelho de Narciso na nova tela global”.

DITADURA DA ESPONTANEIDADE
Nesse novo ambiente o artificialismo e a mistificação da imagem passam a ser “out”. Deusas etéreas cedem espaço a mulheres que querem ser vistas como “reais”: escovam os dentes, fazem caretas para a câmera, dirigem seu carro e não se importam em ser fotografadas em momentos que antes estariam à margem da esfera pública. Tanto que 42% das usuárias do Facebook admitem a publicação de fotos em que estejam embriagadas e 79% delas não veem problemas em expor fotos em que apareçam beijando outra pessoa. A regra é: quanto mais caseiro, “mais natural”; melhor. O que não significa que essa imagem seja, efetivamente, “natural”, mas que há agora um “gerenciamento da espontaneidade”.

O imperativo da representação feminina nas redes sociais é: “seja espontâneo”. Uma norma paradoxal, assim como a afirmação “seja desobediente, é uma ordem”, escreve o sociólogo Régis Debray. Ele faz uma interessante leitura do que poderíamos chamar de “ditadura da espontaneidade”. Segundo o autor, abandonamos o culto da morte, vivido pelas sociedades tradicionais e religiosas, para vivermos o “culto da vida pela vida” – uma espécie de “divinização do que é vivo” que se apoia no eterno presente e não mais em uma crença no além.

Vemos emergir mulheres que cultuam o que veem no espelho e postam, “religiosamente”, novas imagens de seu cotidiano – sem que tal culto resulte em algum tipo de censura externa ou de autocensura moral. Em outro contexto, como durante o período em que a religião católica era dominante, esse “culto de si” e ao corpo seria considerado um dos sete pecados: a vaidade. Esse imaginário, aliás, é muito bem representado por um quadro do séc. 15, de Hieronymus Bosch, no qual o demônio segura um espelho para que uma jovem se penteie.

Hoje o novo espelho global não é marcado pela vigilância moral. Ao contrário, há um contínuo incentivo da cultura para que as mulheres “se valorizem”, busquem sua singularidade e não se baseiem mais em modelos inalcançáveis (como as top models e outras famosas). E para que percebam em si mesmas uma possibilidade legítima e singular de ser no mundo.

A própria familiaridade e aproximação da mulher com o universo da produção de auto-representações pode levá-la a questioná-las. As mulheres já estão, como escreve Lipovetsky em seu livro A tela global, “cultivadas” pela mídia. Educadas em sua gramática, sabem que o photoshop, a produção e a edição das imagens criam uma mulher irreal e passam a ver essas representações “entre aspas”, distanciando-se criticamente delas. Elas aprendem com recursos autoexplicativos a modelar sua iconografia, a alterá-la, brincar com ela ou melhorá-la (possibilidades, antes, restritas aos profissionais).

Mas a consagração do “culto de si” não significou um isolamento da mulher. Os álbuns publicados nas redes sociais conciliam, contra todas as expectativas, o individualismo e as trocas. Um se alimenta do outro. Há um ciclo: exponho minha individualidade, acompanho a do outro e ele a minha e, assim, somos incentivados a produzir e expor, cada vez mais, as nossas imagens. Trata-se do nascimento de uma “identidade coletiva”, em que a individualidade não elimina a interação, mas é seu motor. Nesse sentido, a identidade coletiva não é produto apenas de uma adesão grupal e sim uma forma de negociação de posições subjetivas – esse é o paradoxo identitário a ser considerado.

Fotos pessoais e “amigos” virtuais (ou não) ditam o ritmo desse espaço interativo. Quanto mais caseiro, mais cotidiano, mais espontâneo, maior o número de relações entre as pessoas, que passam a valorizar a autenticidade e a vida de quem é “próximo”, “real”. Há, na base desse fenômeno, uma democratização dos desejos de expressão individual na medida em que as mulheres buscam conquistar espaços de autonomia pessoal – que traduzem a necessidade de escapar à simples condição de consumidoras daquilo que outros produzem. Elas querem colocar seu rosto no mundo. Aparecer ou não na “tela global” passa a ser uma questão de existência. Por essa razão, ter visibilidade e oferecer sua identidade publicamente é conferir importância à própria existência. O que é, também, uma forma de poder. Nesse ponto a mídia – como campo de visibilidade – passa a ter papel central para entendermos a luta simbólica pelo reconhecimento.

No entanto, essa “democratização” da auto-representação feminina não deve ser tomada como sinônimo do fim da competição estética e ética entre as mulheres. O que tudo indica, o que presenciamos não é a instauração de uma igualdade, mas a ampliação do número de mulheres na disputa por visibilidade e poder. Amplia-se, assim, a arena para buscar um poder que não está dado de antemão, mas que deve ser conquistado e manejado pela apresentação e representação de suas singularidades, de suas diferenças. Um agir que se manifesta na criação, no controle e no poder simbólico de sua própria imagem no espaço público, que só se realiza com o reconhecimento do outro nas interações sociais, associativas e na ampliação dos círculos de reconhecimento que estão dentro e fora do espaço de produção da imagem.  

Isabelle Anchieta é jornalista, doutoranda em sociologia pela Universidade de São Paulo (USP) e mestre em comunicação social pela UFMG.

MC

domingo, 6 de novembro de 2011

EUA: Incendeia casa após ser 'desamigada' no Facebook

Fonte da Imagem AQUI.
Uma norte-americana é suspeita de ter pegado fogo à casa de uma amiga depois de esta a ter 'desamigado' no Facebook e encontra-se detida com uma caução de 100 mil dólares (cerca de 72 mil euros).

Jennifer Christine Harris, residente em Des Moines, no estado do Iowa, terá cometido esse facto na noite de 27 de Outubro, após uma violenta discussão no Facebook com Nikki Rasmussen, iniciada quando a primeira anunciou uma festa através da rede social à qual a segunda se recusou a comparecer.

A discussão não demorou a azedar e Nikki 'desamigou' Jennifer, de 30 anos, que reagiu de forma potencialmente homicida, pois a ex-amiga e o marido estavam a dormir quando o incêndio deflagrou, destruindo parcialmente a garagem do edifício.