sexta-feira, 13 de maio de 2011

Elite paulistana


É notório que as elites de Londres, Nova Iorque, Berlim e Paris são atrasadas. Ninguém discute que os ricos dessas quatro cidades representam o pior do mau gosto mundial. É gente com hábitos esquisitos. Vivem de maneira estranha. Teriam muito a aprender com as elites paulistanas e da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. Paris é dividida em 20 distritos. Cada distrito (arrondissement) tem a sua subprefeitura. O XVI distrito é o mais chique da cidade. Paris orgulha-se de não ter ponto algum a mais de 500 metros de uma estação de metrô. Na média, 150 metros. Boa parte dessa elite bizarra deixa o carro em casa e usa o transporte público. Os intelectuais famosos são figurinhas carimbadas no metrô. Cansei de encontrar Jacques Derrida, Jean Baudrillard, Edgar Morin e o amigo de FHC Alain Touraine em vagões das linhas 12, 4 e 1. Gente louca.

Também esbarrei com Catherine Deneuve e Jean-Luc Godard na linha 4, descendo na estação Saint-Sulpice. Deneuve devia estar entediada ou com saudades dos seus tempos de "A Bela da Tarde". As celebridades intelectuais estrangeiras também circulam nos metrôs de Paris. Encontrei Umberto Eco várias vezes em estações do Quartier Latin. Quando fiz o seu curso no Collège de France, pegava, na saída, muitas vezes o mesmo metrô que ele, que fazia um barulho danado, falando alto, gesticulando, discutindo futebol, semiótica e o escambau. Gente estranha. Famosos e ricos com práticas de seres normais. Eu, hein! Paris é uma cidade tão bizarra que a gente passa seis anos lá e sai sem saber onde fica a rodoviária central. Em contrapartida, conhece como a palma da mão seis estações ferroviárias. Que atraso. Uau!

É aquela coisa de museu, trem, ensino público e gratuito do jardim da infância à universidade. Um horror! Enquanto isso, em São Paulo, dominada por uma elite altiva, arrojada e vanguardista, que Getúlio Vargas tentou infrutiferamente civilizar em 1930, o metrô é rejeitado num arrondissement fashion. Moradores organizaram-se para convencer a prefeitura a não abrir uma estação de metrô em Higienópolis. Alegaram que isso traria "ocorrências indesejáveis". Por exemplo, pobres. A avançada elite paulistana prefere viadutos, túneis, "minhocões", elevadas e muito asfalto. A cidade fica mais bonita, o trânsito, como se sabe, anda muito mais rápido e as empreiteiras fazem bons negócios, o que financia campanhas políticas e melhora o nível de vida em Higienópolis. O metrô, portanto, seria um retrocesso.

As reclamações dos pacatos e elegantes moradores de Higienópolis foram ouvidas com todo respeito. O pleito foi atendido. O bairro não terá estação de metrô. Mais uma vitória do bom gosto, do senso prático e do estilo de vida visionário das nossas melhores elites. Há poucos dias, o tucano Alberto Goldman, ex-governador paulista, publicou um artigo para sustentar a inutilidade de um trem-bala entre Rio de Janeiro e São Paulo. Tem razão. Trens de grande velocidade são típicos de sociedades atrasadas como a França, a Inglaterra e o Japão. Se não me engano, Goldman, assim como FHC, mora em Higienópolis.

Juremir Machado da Silva | juremir@correiodopovo.com.br

Correio do Povo

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