segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

OPORTUNIDADE DE EMPREGO

Rorschach:

Cidade procura um caçador de tesouros

Rorschach é possivelmente a primeira cidade no mundo a procurar um caçador oficial de tesouros. Essa pessoa terá durante um ano a missão de descobrir e revelar valores e qualidades escondidas dessa pequena cidade às margens do Lago de Constança.

A ressonância de candidatos e na imprensa foi imensa. Com a ação, os iniciadores mostram que é possível, com poucos recursos, lutar contra a estagnação de um espaço urbano.

O enorme crucifixo de cimento está jogado no chão e quase se afundou no gramado do antigo cemitério ao lado da bela Igreja de Kolumban, construída em 800 d.C. "Foram vândalos que derrubaram a estátua do pedestal há alguns anos", explica um voluntário que prepara o altar para os festejos natalinos. Os membros da paróquia decidiram deixá-la nessa posição incomum para fazer parte do que batizaram posteriormente de "Calvário", um caminho com diversas marcações para levar os fiéis à reflexão. Perguntado por que o crucifixo não foi colocado de volta no seu pedestal, ele é tácito. "Não temos força para levantá-lo".

A imagem pode ser vista como um símbolo da situação atual de Rorschach. No seu apogeu, essa pequena cidade ocupando o espaço de apenas 1,78 quilômetros quadrados às margens do Lago de Constança, no extremo norte da Suíça, foi um centro industrial e comercial importante no país, sobretudo pela presença de inúmeras fábricas de produtos têxteis. Porém, elas começaram a fechar suas portas até os anos 1970 e, desde então, o declínio econômico foi marcante.

Os sinais são vistos até hoje pelas ruas de Rorschach. A estação de trem em frente ao porto está fechada há muitos anos para reformas. No seu primeiro andar, as janelas vazias do restaurante mostram que ninguém mais senta nas suas mesas para admirar a bela vista do lago. A situação também não é diferente para vários hotéis e lojas, de portas fechadas, vitrines vazias e letreiros quebrados. Várias casas estão praticamente em ruínas como se vê no reboco caído e nas janelas quebradas.

A justificativa do aspecto relativamente desolador está nos números. Desde 1963, a pequena cidade perdeu 36% da sua população: de 13.420 para 8.703 habitantes. Muitos dos que ficaram não têm poder de compra e até dependem do governo para sobreviver. Rorschach tem uma proporção de 40% de estrangeiros, migrantes de várias gerações, e já apareceu várias vezes nas manchetes de jornais pelos problemas ligados à integração e à violência cometida por pessoas de outras nacionalidades.

A imagem da cidade é tão ruim, que mesmo os habitantes da comuna vizinha, Rorschacherberg, recusaram nas urnas durante o plebiscito de 30 de novembro a proposta de fusão com Rorschach. Justificativa dada pelos jornais locais: eles não querem se juntar com uma comuna pobre, que precisa cobrar impostos mais elevados para cobrir seus custos.

Novos tempos

Porém, os ventos estão soprando em outra direção. Em 19 de novembro, a prefeitura publicou um pequeno anúncio no seu site procurando um "caçador oficial de tesouros". Na descrição do emprego – uma ocupação de quatro horas por semana durante todo o ano de 2009 e dotado com um salário anual de sete mil francos suíços - ela foi original: "O candidato deve investigar e descobrir tesouros esquecidos, enterrados e adormecidos da cidade de Rorschach, para depois registrá-los e publicá-los".

A curiosa idéia despertou o interesse da mídia e colocou a pequena cidade nos noticiários nacionais e até de países vizinhos, como a Alemanha. "Eu não esperava que o anúncio tivesse uma ressonância tão grande", confessa Thomas Müller, prefeito de Rorschach, que também é deputado federal pelo Partido Democrata Cristão (PDC).

Nascido e criado na pequena cidade, ele mesmo admite que durante muitas décadas ela esteve estagnada. Mas, graças à dissolução do parlamento comunal em 2005, o bloqueio político foi removido e a estrutura de decisões modernizada. "Agora, estamos conseguindo realizar as mudanças necessárias para desenvolver a cidade. Eu fui conclamado pela população para assumir essa tarefa", conta sem modéstia.

O interesse pelo posto de caçador de tesouros tem surpreendido os autores da proposta. Até agora, 37 pessoas enviaram seus currículos para a prefeitura de Rorschach. "São pessoas com as profissões mais diversas, como arqueólogo, jornalista, professores, aposentados e outros", conta o secretário comunal Bruno Seelos. Ele também se lembra de alguns casos curiosos. "Uma pessoa ligou e disse que tinha um detector de metais e que estava interessada no posto. Nós tivemos de lhe explicar que os tesouros imaginados por nós são de outra natureza".

Seelos explica que o candidato ideal é uma pessoa comunicativa, cuja principal tarefa será sair às ruas de Rorschach, abordar os cidadãos e descobrir valores e outras qualidades da cidade que não podem ser reconhecidos à primeira vista. Concretamente, o caçador de tesouros irá publicar suas descobertas a cada duas semanas em uma coluna no jornal St-Galler Tagblatt e num blog. "Dessa forma, os habitantes poderão estar sempre descobrindo coisas novas da sua cidade", acrescenta o secretário comunal.

O autor da idéia

O caçador de tesouros de Rorschach será anunciado oficialmente em 11 de dezembro pela prefeitura através de uma coletiva de imprensa. A escolha do candidato será feita pelo sociólogo Mark Riklin, que é o autor original da idéia. Como professor da Faculdade de Ciências Aplicadas de St-Gallen, ele havia organizado em outubro de 2007 uma ação intitulada "Cidade como Palco", no qual 60 estudantes vestidos com roupas de operários vasculharam as ruas de Rorschach (clique AQUI para ver o vídeo). Depois de uma tarde, os jovens listaram 169 tesouros. Um deles, o antigo – mas ainda em utilização – guindaste do porto ganhou até uma placa comemorativa com o número 61.

Três semanas depois da ação, Riklin e seus estudantes entregaram oficialmente ao prefeito da cidade um manifesto intitulado "O Lago é bonito de cheirar", no qual eles conclamavam Rorschach a ser a primeira cidade no mundo a contratar um caçador de tesouros. A proposta não deve ser vista como uma forma de melhorar a imagem da cidade. "Eu nunca diria que Rorschach é um lugar decadente. Pelo contrário, eu acho que essa cidade e qualquer lugar no mundo têm muitos potenciais escondidos. Encontrar tesouros significa que o futuro é possível", justifica o professor. Ele também explica que os tesouros encontrados pelos seus estudantes são apenas sugestões. "Esse trabalho foi feito apenas em uma tarde e sem uma grande participação da população".

A escolha dessa inusitada profissão também tem um aspecto lúdico. "Quem nunca sonhou em encontrar um tesouro? Quando falo em caçador de tesouros, a criança que temos dentro de nós é abordada. Essa imagem tem uma conotação muito positiva para todas as pessoas envolvidas", explica Riklin, que também será o orientador do futuro empregado da cidade.

Ceticismo inicial

Como os políticos locais consideraram a idéia de contratar um caçador de tesouros? A resposta é acompanhada de risos pelo prefeito. "No início, eu a vi com muito ceticismo, mas agora estou adorando. Acho que o principal objetivo é mostrar aos nossos cidadãos o lugar bonito em que eles vivem", diz Thomas Müller. Ele próprio confessa ter algumas sugestões de tesouro, como uma minúscula e escondida capela utilizada por ele e seus amigos na infância para fumar escondido os primeiros cigarros.

Para o prefeito, Rorschach está a caminho de recuperar o seu antigo brilho. Além do caçador de tesouros, ele cita projetos como a construção aprovada nas urnas de três novos prédios residenciais, a instalação de um grande centro de formação profissional da multinacional alemã Würth e diversas reformas realizadas em praças e outros prédios públicos e privados da cidade.

Também em relação às finanças, a época de vacas magras passou, como revela o secretário comunal. "Depois de muitos anos de déficit de caixa e dependência da ajuda do cantão, desde o ano passado foi possível anunciar o primeiro superávit", alegra-se Seelos. Seu otimismo também é reforçado pela perspectiva de bons resultados para o futuro colaborador. "Estou convencido que temos muitos tesouros escondidos na cidade".

swissinfo, Alexander Thoele

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