Mostrando postagens com marcador Saúde. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Saúde. Mostrar todas as postagens

sábado, 25 de dezembro de 2021

2021: O ANO QUE MUDOU NOSSAS VIDAS

 


 Por Julia Ribeiro, para Canal Meio (canalmeio.com.br)

O ano parecia que não ia terminar. Muitas perguntas sem respostas. Horas de trabalho excessivas, crises de pânico, sobrecarga parental, exaustão materna, crescimento no número de divórcios e estresse prolongado. Casa virou trabalho, computador virou escola. Os sintomas da síndrome de burnout antes confinados aos ambientes laborais, transbordaram para outros âmbitos da vida cotidiana. A louça se acumulou. Os boletos não pararam de chegar. Conflitos latentes. Tensões antes veladas foram descortinadas.

“Nós nos revelamos para nós mesmos e para os outros. A sociedade se revelou em seus mecanismos cruéis, desiguais ou exploradores. Os pais, os filhos, os amantes, os chefes, os miseráveis e os ultrarricos: tudo está exposto”, resume a psicanalista Maria Homem, que escreveu o livro Lupa da Alma – Quarentena-revelação (Todavia).

No segundo ano de pandemia, especialistas registraram um aumento vertiginoso nos casos de transtornos mentais. A explicação é que a excessiva vigilância contra o vírus estressou nosso sistema hormonal e endócrino de maneira prolongada, tornando-nos mais vulneráveis a patologias psiquiátricas.  A Organização Mundial da Saúde (OMS) denominou de fadiga pandêmica o cansaço derivado do esgotamento gerado pela hipervigilância e pelo medo. Um estudo da Universidade de Oxford revelou que 34% dos que tiveram covid-19 desenvolveram problemas psicológicos dentro de seis meses após terem sido infectados. Publicada na revista The Lancet Psychiatry, a pesquisa aponta ainda que 17% dos pacientes contaminados pelo coronavírus foram diagnosticados com distúrbios de ansiedade e 14% com distúrbios de humor.

Burnout como doença ocupacional

A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que mais de trezentos milhões de pessoas, no mundo todo, sofrem de depressão. Na América Latina, o Brasil é o país com mais casos. Eles aumentaram ao longo da pandemia. Até 2030, esta será a doença mais comum no país. Entre os distúrbios, um dos mais relatados pelos médicos é o burnout. A partir de janeiro de 2022, entrará em vigor a nova categorização da síndrome pela OMS, a CID 11 (classificação de transtornos mentais e comportamento).

O que muda na prática? Segundo especialistas, a nova classificação vai facilitar o reconhecimento pelo INSS do direito ao afastamento por doença ocupacional, já que a classificação relaciona a doença diretamente ao trabalho, o que não ocorre com outras síndromes. A mudança abre espaço para pedidos de indenização, por exemplo.

Alterações repentinas de humor, cansaço extremo e irritabilidade. Os sintomas do burnout muitas vezes são semelhantes aos de outras condições de saúde como a ansiedade e a depressão.

Apesar de a OMS destacar que o esgotamento “se refere especificamente a fenômenos relativos ao contexto profissional”, para muitos, a falta de fronteiras entre trabalho e vida pessoal foi o grande gatilho - eis outro termo que marcou 2021.

Contornos, limites e angústias

Foi um ano indigesto. Corpos não velados, casas e relações bagunçadas. Intermináveis ciclos de recomeços para uns, ponto final para outros. Se antes a pergunta Como você está? era meramente protocolar, respostas mais honestas começaram a aparecer ao longo do ano. Já que não tivemos para onde fugir, fomos forçados a dialogar com nossas dores, medos e sombras mais profundas?

“Para aqueles que têm saúde mental suficiente, sim. Foi e está sendo uma oportunidade de se deparar com aquilo que se é, com aquilo que se teme. Seja individualmente, entre casais e em família, nunca estivemos tão debruçados nas relações com o convívio intenso gerado pelo isolamento. Ao olhar para nossos contornos e limites, muitos se viram diante de angústia”, responde a Maria Homem.

Para ela, ainda estamos digerindo esse ano tão pesado. A psicanalista faz uma síntese radical: “assustamo-nos com a violência em jogo nas relações íntimas, sociais e globais. Estamos sofrendo de transtorno pós-trauma e com todo o lixo que jogamos debaixo do tapete nos longos tempos pré-trauma”.

Maria Homem registrou em seu livro que as emoções ficaram à flor da pele neste ano. Se estávamos buscando formas de mantê-las sob controle, ou sob anestesia, agora parecem ter obtido um passe livre para circular sem tanta repressão.

“A semente de inquietação ou loucura dentro de nós parece que se expande. Irrequietos não conseguem ficar quietos ou em casa. Deprimidos ficam mais tristes e ansiosos. Loucos ficam mais delirantes. Agudizar seria o verbo destes tempos?”

A psicanalista Márcia Luna Azulay contradiz o senso comum de que a pandemia causou o adoecimento psíquico das pessoas.  “Os quadros se intensificaram porque já existiam dentro de cada um. Sejam transtornos alimentares ou crises conjugais. Eles apareceram, ficaram visíveis. Apesar da síndrome ser considerada um fenômeno estritamente associado ao âmbito profissional, o estresse crônico se instalou na sala de casa. E nas relações. Na pandemia, o burnout passou a acontecer dentro de casa. E essas características ligadas ao trabalho, como o excesso de tarefas e cobranças, atingiram as outras áreas da vida”, opina Márcia.

“Variações” do burnout clássico não se restringiram ao campo ocupacional. Exaustão emocional, mental e física são os componentes que resumem a síndrome de acordo com Ayala Malach Pines (1945-2012) psicóloga, pioneira na investigação do tema e autora de Couple Burnout: Causes and Cures (Burnout de Casais: Causas e Curas, em tradução livre). Para a pesquisadora, a síndrome resultante consiste em sentimentos de desamparo, desesperança, de estar preso numa armadilha, com sintomas de irritabilidade e apatia.

Até que a pandemia nos separe

A “torta de climão” servida na mesa de jantar. As mudanças drásticas na rotina impulsionaram um novo recorde de divórcios no primeiro semestre de 2021.  Dados do Colégio Notarial do Brasil indicam que de janeiro a junho de 2021, foram 37.083 divórcios, um aumento de 24% em relação ao primeiro semestre do ano passado, com o início da pandemia da covid-19. Há dois anos, 75.033 casais oficializaram a separação.  A quarentena é apontada como principal responsável pelo fenômeno, além da facilitação dos trâmites, que agora podem ser feitos pela internet.

Selvageria do inconsciente

O “cérebro pandêmico” é um termo não clínico que chegou a ser usado por cientistas para definir os efeitos do estresse crônico e prejuízos psíquicos decorrentes da covid-19.  Os danos na área da saúde mental compõem uma pandemia silenciosa. Só o tempo para sublimar, elaborar e compreender as suas consequências.

“Ainda precisaremos de alguns anos (décadas?) para mensurar. De certa forma, um dos mecanismos de defesa, ainda em voga, foi minimizar ou mesmo precisar negar o medo e a angústia diante dessa ameaça. O que, por sua vez, não é sem efeitos – e cobra seu preço. A própria estratégia defensiva delirante tem alto custo psíquico”, reflete a Maria Homem.

Para fugir do tédio, uns aprenderam a fazer pão, outros a costurar. Teve gente que comprou cursos on-line por impulso e não teve paciência (ou foco) de fazê-los. Uns aprenderam a lidar com a falta de intimidade com o digital. Quem pôde fugiu para as montanhas. Nos sentimos cansados. Mais do que isso: foi inevitável olhar para si.

Dentro de um ambiente de confinamento forçado, nossos aspectos psíquicos pularam para fora sem dó nem piedade. “Lá fora é perigoso, o que temperou mais ainda a selvageria do inconsciente que aproveitou o medo para puxar todo mundo para dentro”, resume o terapeuta junguiano Gustavo Otero.

“Todos foram expostos às tempestades internas que antes eram solenemente negadas. Na tentativa de fugir, muitos se jogaram no trabalho. Mas não tem jeito, o inconsciente foi claro: tem que olhar para dentro. Então, tivemos uma onda gigantesca de burnouts, não só no trabalho”, explica Gustavo.

Para ele, a sociedade hiperestimulada e superconectada se viu em 2021 com uma tarefa que nunca poderia imaginar: “O trabalho foi dado: convivam, mas não só com quem está do lado, conviva e aprenda a conhecer os muitos que existem dentro de nós mesmos e que antes, talvez, nem fazíamos ideia de que existiam”, destaca o terapeuta.

Quando isso vai acabar? Quando chega a minha vez de vacinar? É gripe ou covid? Deu negativo? Ufa. Fulano foi internado. Piorou. Não, não vai ter velório. Faz o que com essa dor? Os processos de luto mudaram. Os reais e simbólicos.

Maria Homem destaca sobre a necessidade de escuta das pessoas. Espaços simbólicos que buscam elaborar a experiência bruta via palavra e linguagem são necessários em todas as instituições. Das empresas às escolas, das famílias aos círculos sociais.

Este 2021 que termina foi um ano distopicamente trágico. Mesmo diante de tantos conflitos pessoais e traumas coletivos, houve brechas para alegrias e (re)descobertas. Situações caóticas foram oportunidades de renegociação de acordos na convivência familiar. Novas formas de interagir, de brincar e de se amparar. A tensão foi dissipada com afeto. Solidão virou solitude. Perdemos. Celebramos pequenas vitórias. Novo. Normal. É tempo de revisar o que é normal e o que é verdadeiramente novo.

 

Fonte da Imagem: https://michiganvirtual.org/blog/your-brain-in-crisis-why-its-so-hard-to-learn-during-difficult-times/ 


quarta-feira, 15 de abril de 2020

COVID-19 NO BRASIL - PERSPECTIVAS A CURTO E MÉDIO PRAZOS


Cenários para 2020 e início de 2021



Estamos no meio de uma situação que pode ser considerada atípica: a pandemia de Covid-19.

No País existem duas correntes de pensamento básicas, que disputam a hegemonia dos encaminhamentos que serão realizados:

Primeira Corrente: Capitaneada pelo Presidente da República, considera que a pandemia não é tão preocupante e que a economia deve ser reativada o mais cedo possível. Se essa tese estiver certa, a retomada da atividade econômica poderia ser iniciada ainda no primeiro semestre de 2020. A grande dúvida decorrente deste ponto de vista é a situação que se observou em outros países: após a tentativa de retomada das atividades econômicas o vírus se disseminou e causou uma grande desorganização social, com as pessoas retomando o isolamento. Se essa hipótese ocorrer, a retomada da economia somente se dará a partir da metade do ano de 2021.

Segunda Corrente: Defendida parcialmente pelo cambaleante Ministro da Saúde e totalmente por organizações científicas, entendem que o isolamento social é a melhor solução para evitar contaminação em massa. Essa corrente acredita que o pico da pandemia no Brasil se dará durante o mês de maio e que em junho ou julho a situação já estará sob controle. Nessa hipótese, a retomada da economia pode se dar, gradativamente, a partir do quarto trimestre de 2020.

Esse é meu chute calibrado.

15 de abril de 2020.

Fonte da imagem: internet.


quarta-feira, 17 de abril de 2019

PERIGO! A ÁGUA BRASILEIRA ESTÁ ENVENENADA.



Por Ana Aranha, Luana Rocha, Agência Pública/Repórter Brasil. 

São Paulo, Rio de Janeiro e outras 1.300 cidades acharam agrotóxicos na rede de abastecimento. Dados do Ministério da Saúde revelam que a água do brasileiro está contaminada com substâncias que podem causar doenças graves


Um coquetel que mistura diferentes agrotóxicos foi encontrado na água de 1 em cada 4 cidades do Brasil entre 2014 e 2017. Nesse período, as empresas de abastecimento de 1.396 municípios detectaram todos os 27 pesticidas que são obrigados por lei a testar. Desses, 16 são classificados pela Anvisa como extremamente ou altamente tóxicos e 11 estão associados ao desenvolvimento de doenças crônicas como câncer, malformação fetal, disfunções hormonais e reprodutivas. Entre os locais com contaminação múltipla estão as capitais São Paulo, Rio de Janeiro, Fortaleza, Manaus, Curitiba, Porto Alegre, Campo Grande, Cuiabá, Florianópolis e Palmas.

Os dados são do Ministério da Saúde e foram obtidos e tratados em investigação conjunta da Repórter Brasil, Agência Pública e a organização suíça Public Eye. As informações são parte do Sistema de Informação de Vigilância da Qualidade da Água para Consumo Humano (Sisagua), que reúne os resultados de testes feitos pelas empresas de abastecimento.

Os números revelam que a contaminação da água está aumentando a passos largos e constantes. Em 2014, 75% dos testes detectaram agrotóxicos. Subiu para 84% em 2015 e foi para 88% em 2016, chegando a 92% em 2017. Nesse ritmo, em alguns anos, pode ficar difícil encontrar água sem agrotóxico nas torneiras do país.

Embora se trate de informação pública, os testes não são divulgados de forma compreensível para a população, deixando os brasileiros no escuro sobre os riscos que correm ao beber um copo d’água. Em um esforço conjunto, a Repórter Brasil, a Agência Pública e a organização suíça Public Eye fizeram um mapa interativo com os agrotóxicos encontrados em cada cidade. O mapa revela ainda quais estão acima do limite de segurança de acordo com a lei do Brasil e pela regulação europeia, onde fica a Public Eye.

Saiba o nível de contaminação da sua cidade clicando na imagem abaixo.




O retrato nacional da contaminação da água gerou alarde entre profissionais da saúde. “A situação é extremamente preocupante e certamente configura riscos e impactos à saúde da população”, afirma a toxicologista e médica do trabalho Virginia Dapper. O tom foi o mesmo na reação da pesquisadora em saúde pública da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Pernambuco, Aline Gurgel: “dados alarmantes, representam sério risco para a saúde humana”.

Entre os agrotóxicos encontrados em mais de 80% dos testes, há cinco classificados como “prováveis cancerígenos” pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos e seis apontados pela União Europeia como causadores de disfunções endócrinas, o que gera diversos problemas à saúde, como a puberdade precoce. Do total de 27 pesticidas na água dos brasileiros, 21 estão proibidos na União Europeia devido aos riscos que oferecem à saúde e ao meio ambiente.

A falta de monitoramento também é um problema grave. Dos 5.570 municípios brasileiros, 2.931 não realizaram testes na sua água entre 2014 e 2017.
Coquetel tóxico

A mistura entre os diversas químicos foi um dos pontos que mais gerou preocupação entre os especialistas ouvidos. O perigo é que a combinação de substâncias multiplique ou até mesmo gere novos efeitos. Essas reações já foram demonstradas em testes, afirma a química Cassiana Montagner. “Mesmo que um agrotóxico não tenha efeito sobre a saúde humana, ele pode ter quando mistura com outra substância”, explica Montagner, que pesquisa a contaminação da água no Instituto de Química da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), de São Paulo. “A mistura é uma das nossas principais preocupações com os agrotóxicos na água”.

Os paulistas foram os que mais beberam esse coquetel nos últimos anos. O estado foi recordista em número de municípios onde todos os 27 agrotóxicos estavam na água. São mais de 500 cidades, incluindo a grande São Paulo – Guarulhos, São Bernardo do Campo, Santo André e Osasco – além da própria capital. E algumas das mais populosas, como Campinas, São José dos Campos, Ribeirão Preto e Sorocaba. O Paraná foi o segundo colocado, com coquetel presente em 326 cidades, seguido por Santa Catarina e Tocantins.



Os especialistas falam muito sobre a “invisibilidade” do efeito coquetel. As políticas públicas não monitoram a interação entre as substâncias porque os estudos que embasam essas políticas não apontam os riscos desse fenômeno. “Os agentes químicos são avaliados isoladamente, em laboratório, e ignoram os efeitos das misturas que ocorrem na vida real”, diz a médica e toxicologista Dapper.

Por isso, ela lamenta, as pessoas que já estão desenvolvendo doenças em decorrência dessa múltipla contaminação provavelmente nunca saberão a origem da sua enfermidade. Nem os seus médicos.

Questionado sobre quais medidas estão sendo tomadas, o Ministério da Saúde enviou respostas por email reforçando que “a exposição aos agrotóxicos é considerada grave problema de saúde pública” e listando efeitos nocivos que podem gerar “puberdade precoce, aleitamento alterado, diminuição da fertilidade feminina e na qualidade do sêmen; além de alergias, distúrbios gastrintestinais, respiratórios, endócrinos, neurológicos e neoplasias” (Leia a íntegra das respostas do Ministério da Saúde).

A resposta, porém, ressalta que ações de controle e prevenção só podem ser tomadas quando o resultado do teste ultrapassa o máximo permitido em lei. E aí está o problema: o Brasil não tem um limite fixado para regular a mistura de substâncias.

Essa é uma das reivindicações dos grupos que pedem uma regulação mais rígida para os agrotóxicos. “É um absurdo esse problema ficar invisível no monitoramento da água e não haver ações para controlá-lo”, afirma Leonardo Melgarejo, engenheiro de produção e membro da Campanha Nacional Contra os Agrotóxicos e Pela Vida “Se detectar diversos agrotóxicos, mas cada um abaixo do seu limite individual, a água será considerada potável no Brasil. Mas a mesma água seria proibida na França”.

Ele se refere à regra da União Europeia que busca restringir a mistura de substâncias: o máximo permitido é de 0,5 microgramas em cada litro de água – somando todos os agrotóxicos encontrados. No Brasil, há apenas limites individuais. Assim, somando todos os limites permitidos para cada um dos agrotóxicos monitorados, a mistura de substâncias na nossa água pode chegar a 1.353 microgramas por litro sem soar nenhum alarme. O valor equivale a 2.706 vezes o limite europeu.

O risco das pequenas quantidades

Mesmo quando se olha a contaminação de cada agrotóxico isoladamente, o quadro preocupa. Dos 27 agrotóxicos monitorados, 20 são listados como altamente perigosos pela Pesticide Action Network, grupo que reúne centenas de organizações não governamentais que trabalham para monitorar os efeitos dos agrotóxicos.

Mas, aos olhos da lei brasileira, o problema é pequeno. Apenas 0,3% de todos os casos detectados de 2014 a 2017 ultrapassaram o nível considerado seguro para cada substância. Mesmo considerando os casos em que se monitora dez agrotóxicos proibidos no Brasil, são poucas as situações em que a presença deles na água soa o alarme.

E esse é o segundo alerta feito por parte dos pesquisadores: os limites individuais seriam permissivos. “Essa legislação está há mais de 10 anos sem revisão, é muito atraso do ponto de vista científico” afirma a química Montagner. “É como usar uma TV antiga, pequena e preto e branco, quando você pode ter acesso a uma HD de alta definição”.

Ela se refere a pesquisas mais recentes sobre os riscos do consumo frequente e em quantidades menores, um tipo de contaminação que não gera reações imediatas. “Talvez certo agrotóxico na água não leve 15% da cidade para o hospital no mesmo dia. Mas o consumo contínuo gera efeitos crônicos ainda mais graves, como câncer, problemas na tireoide, hormonal ou neurológico”, alerta Montagner. “Já temos evidências científicas, mas a água contaminada continua sendo considerada como potável porque não se olha as quantidades menores”, afirma.



Em resposta a essa crítica, um grupo de trabalho foi criado pelo Ministério da Saúde para rever os limites da contaminação. “Estamos fazendo um trabalho criterioso”, afirma Ellen Pritsch, engenheira química e representante da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental no grupo. Segundo ela, pesquisas internacionais e regulações de outros países estão sendo levados em conta. Criado em 2014, a previsão é que os trabalhos sejam concluídos em setembro.

Pelo menos 144 cidades detectaram o mesmo pesticida de modo contínuo durante os quatro anos de medições seguidos, segundo os dados. Mais uma vez, São Paulo é o recordista desse fenômeno de intoxicação. Especialistas ouvidos pela reportagem apontam o uso de pesticidas na produção de cana de açúcar como a provável origem para a larga contaminação do estado. “A cultura da cana é a que tem mais herbicidas registrados. Como São Paulo é um dos maiores produtores de cana, isso justifica sua presença elevada [de pesticidas na água]”, afirma Kassio Mendes, coordenador do comitê de qualidade ambiental da Sociedade Brasileira da Ciência das Plantas Daninhas.

O diuron, um dos principais herbicidas usados pelo setor, foi detectado em todos os testes feitos na água dos mananciais das regiões onde mais se cultiva cana no estado, segundo dados de 2017 da Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb). A substância é uma das apontadas como provável cancerígena pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos.



De quem é a responsabilidade?

Depois de contaminada, são poucos os tratamentos disponíveis para tirar o agrotóxico da água. “Alguns filtros são capazes de tirar alguns tipos de agrotóxicos, mas não há um que dê conta de todos esses”, afirma Melgarejo. “A água mineral vem de outras fontes, mas que são alimentadas pela água que corre na superfície, então eventualmente também serão contaminadas”.

O trabalho preventivo, ou seja, evitar que os agrotóxicos cheguem aos mananciais, deveria ser primordial, afirma Rubia Kuno, gerente da divisão de toxicologia humana e saúde ambiental da Cetesb. “O esforço deve ser na prevenção porque o sistema de tratamento convencional não é capaz de remover os agrotóxicos da água”, afirma.

É grande o debate sobre a complexidade em se enfrentar o problema, mas é difícil encontrar quem está assumindo a responsabilidade.

A reportagem procurou as secretarias do Meio Ambiente, Agricultura e Saúde e Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) para entender quais ações são tomadas no estado com o maior índice de contaminação. As respostas foram dadas pela Sabesp e pela assessoria do meio ambiente com informações técnicas sobre o monitoramento. Nem as secretarias nem a empresa esclareceram o que está sendo feito para controlar ou prevenir o problema. (Leia a íntegra das respostas da Sabesp e da Secretaria do Meio Ambiente)



O Ministério da Saúde diz que a vigilância sanitária dos municípios e dos estados deve dar o alerta aos prestadores de serviços de abastecimento de água para que tomem as providências de melhoria no tratamento da água. “Caso os dados demonstrem que o problema ocorre de forma sistemática, é preciso buscar soluções a partir da articulação com os demais setores envolvidos, como órgãos de meio ambiente, prestadores de serviço e produtores rurais”, diz a nota enviada pelo órgão.

Questionado sobre quais ações estão sendo tomadas, o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (Sindiveg), que representa os produtores de agrotóxicos, fez uma defesa sobre a segurança dos pesticidas. Em nota, o grupo afirma que a avaliação feita pela Anvisa, Ibama e Ministério da Agricultura garante que eles são seguros ao trabalhador, população rural e ao meio ambiente “sempre que utilizados de acordo com as recomendações técnicas aprovadas e indicadas em suas embalagens”.

O sindicato afirma que a aplicação correta dos produtos no campo é um desafio e atribui a responsabilidade aos trabalhadores que aplicam os pesticidas. “O setor de defensivos agrícolas realiza iniciativas para garantir a aplicação correta de seus produtos, uma vez que alguns problemas estruturais da agricultura como a falta do hábito da leitura de rótulo e bula e analfabetismo no campo trazem um desafio adicional de cumprimento às recomendações de uso”.



Ao contrário do que ocorre em outros países, no Brasil as empresas que produzem agrotóxicos não se envolvem com o monitoramento da água, que é custeado pelos cofres públicos e pelas empresas de abastecimento.

Em Santa Catarina, que está entre os três estados com maior contaminação, o Ministério Público Estadual chamou a responsabilidade de prefeituras, secretarias estaduais, concessionárias de água, agências reguladoras e sindicatos de produtores e trabalhadores rurais. A iniciativa partiu dos resultados de um estudo inédito que encontrou agrotóxicos na água de 22 municípios. “Alertamos todos os órgãos públicos e privados envolvidos para buscar soluções, é preciso aplicar medidas corretivas para diminuir os riscos dos cidadãos”, diz a promotora Greicia Malheiros, responsável pela investigação. A iniciativa teve início em março desse ano e ainda não tem resultados.

Mais do que remediar a contaminação da água, a coordenadora técnica do estudo, a engenheira química Sonia Corina Hess, defende a proibição do uso dos pesticidas que oferecem maior risco. Das substâncias encontradas em seu estudo no estado catarinense, sete estão proibidas na União Europeia por oferecer risco à saúde humana. “Tem que proibir o que é proibido lá fora, tem que proibir o que é perigoso. Se faz mal para eles porque no Brasil é permitido?”, questiona.
Perigoso na Europa, permitido no Brasil

O controle da água feito pelo Brasil também está distante dos parâmetros da União Europeia. Com o objetivo de eliminar a contaminação, o continente fixou a concentração máxima na água em 0,1 micrograma por litro – valor que era o mínimo detectável quando a regulação foi criada.

Para descobrir como a água do Brasil seria avaliada pelo padrão europeu, a organização Public Eye classificou os dados fornecidos pelo Ministério da Saúde segundo o critério daquele continente. Alguns dos agrotóxicos mais perigosos ultrapassaram os limites europeus em mais de 20% dos testes. Entre eles, o glifosato e o mancozebe, ambos associados a doenças crônicas, e o aldicarbe, proibido no Brasil e classificado pela Anvisa como “o agrotóxico mais tóxico registrado no país, entre todos os ingredientes ativos utilizados na agricultura”.

O glifosato é o caso mais revelador sobre as peculiaridades do Brasil na regulação sobre agrotóxicos. Classificado como “provável carcinogênico” pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer, órgão da Organização Mundial da Saúde, o pesticida está sendo discutido em todo o mundo. Há milhares de pacientes com câncer processando os fabricantes nos Estados Unidos – e vencendo nos tribunais – além de protestos e petições pedindo a sua proibição na Europa. Não há consenso, entre as agências reguladoras, sobre sua classificação. No Brasil, que oficialmente colocou a substância em revisão desde 2008, o Ministério da Agricultura liberou novos registros para a venda de glifosato no início deste ano. O pesticida passou a ser vendido em novas formas, quantidades e por número maior de fabricantes.

Nos testes com a água do país, a controversa substância foi a que mais ultrapassou a margem de segurança segundo o critério da União Europeia: 23% dos casos acima do limite. Pela lei brasileira, o glifosato foi um dos que menos soou o alarme: apenas 0,02% dos testes ultrapassaram o nosso limite.



“Isso é um escândalo de saúde pública. Nós colocamos o limite alto, lá na estratosfera, e aí comemoramos que temos uma água segura”, questiona a pesquisadora Larissa Bombardi, professora de geografia na Universidade de São Paulo e autora de um atlas que compara a lei brasileira e europeia no controle dos agrotóxicos. Seu estudo revela como nossos limites chegam a ser 5 mil vezes mais altos que os europeus. O caso mais grave é o do glifosato: enquanto na Europa é permitido apenas 0,1 miligramas por litro na água, aqui no Brasil a legislação permite até 500 miligramas por litro.

Como o glifosato é o agrotóxico mais vendido no país, e também o que tem o limite mais generoso para presença na água, Bombardi lança suspeitas sobre os critérios usados: “no caso do glifosato é realmente difícil encontrar justificativa científica, parece ser mais uma decisão política e econômica”. O pesticida foi o mais consumido em 2017 no Brasil com 173 mil toneladas vendidas, segundo o Ibama. O volume corresponde a 22% das estimativas de vendas para esse químico em todo o mundo no mesmo ano – o que faz do Brasil um importante mercado para as fabricantes, entre elas as gigantes Syngenta e a Monsanto – comprada pela Bayer no ano passado.


Limites generosos

A larga diferença entre os limites fixados pela União Europeia e pelo Brasil é um dos principais argumentos dos críticos do uso da substância no Brasil. “Essa diferença só pode se dar por dois motivos. Ou porque nossa sociedade é mais forte, somos seres mais resistentes aos agrotóxicos. Ou mais tola, porque estamos sendo ingênuos quanto aos riscos que corremos”, provoca Melgarejo, da Campanha Contra os Agrotóxicos.

A engenheira química Ellen Pritsch, representante da Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental no grupo de trabalho que reavalia os limites dos pesticidas na água, discorda. Para ela, os atuais limites são seguros e foram fixados com embasamento científico. “O critério brasileiro é dez vezes menor do que o efeito que geraria problema. Então, mesmo que seja encontrado um percentual acima esse valor, ainda assim seria menor [estaria abaixo do risco]”, afirma.

Antes de aprovar os registros dos agrotóxicos, as empresas fabricantes entregam estudos com testes feitos com animais em laboratórios. O Sindiveg, sindicato da indústria de fabricantes de pesticidas, defende que esses estudos são o suficiente para avaliar os riscos das substâncias. “São estudos de bioconcentração em peixes e micro-organismo, algas e organismos do solo, abelhas, microcrustáceos, peixes e aves”, afirma nota enviada pelo Sindiveg em resposta às perguntas da reportagem.

A principal reivindicação dos grupos que fazem campanha pelo controle dos agrotóxicos é por mais restrição e até pela proibição de alguns dos pesticidas hoje aprovados no país, como a atrazina, o acefato e o paraquate, que são campeões de venda no Brasil, mas proibidos na União Europeia.

Mas o governo aponta na direção oposta. A responsável pela pasta da agricultura, ex-líder da bancada ruralista Tereza Cristina, foi presidente da comissão especial na Câmara que aprovou, em junho passado, o Projeto de Lei que propõe agilizar a aprovação de novos agrotóxicos no país. Apelidado pelos críticos como o “PL do veneno”, já gerou grande polêmica, sendo criticado em uma carta assinada por mais de 20 grupos da comunidade científica.

Sem previsão de conseguir maioria no Congresso para aprovar o PL, a estratégia parece ter mudado. Desde o início do ano, o Ministério da Agricultura publicou novos registros para 152 agrotóxicos, uma velocidade recorde de 1,5 aprovações por dia. Chamada para esclarecer as liberações em audiência na Câmara na última terça-feira (9), a ministra disse que “não existe liberação geral” e que longos processos de aprovação só atrasam o agronegócio brasileiro. Ela chamou de “desinformação” os estudos que apontam os riscos dessas substâncias e, usando o mesmo argumento do sindicato dos produtores de agrotóxicos, declarou que as intoxicações ocorrem devido ao modo como os trabalhadores aplicam as substâncias. Um dia depois da audiência, o governo aprovou a comercialização de mais 31 agrotóxicos no Brasil.


Esta reportagem faz parte do projeto Por Trás do Alimento, uma parceria da Agência Pública e Repórter Brasil para investigar o uso de Agrotóxicos no Brasil. A cobertura completa está no site do projeto.
Fonte da Reportagem: http://desacato.info/

Fonte da Imagem:

domingo, 14 de abril de 2019

UMA LIÇÃO DE KAWAI SENSEI




OBSERVE:



A água em movimento, como a que desce um morro, é límpida. Transparente. Sem odor.

A água parada fica turva, com cheiro ruim. Nela crescem bactérias e larvas de mosquitos, inclusive da dengue.


.o0o.



O corpo humano possui cerca de 65% de água em homens adultos e 60% em mulheres adultas.



Se as pessoas fazem exercícios ficam como água em movimento.



Se as pessoas não se exercitam ficam como água parada.



.o0o.



Se você não tem impedimento físico,



A ESCOLHA É SUA!






Kawai Sensei foi o introdutor do Aikido no Brasil.

A foto da imagem é de minha autoria (Costa da Lagoa da Conceição).