sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009
Estilo ‘absolutista' de papa atrai críticas
Assimina Vlahou
De Roma para a BBC Brasil
Quatro anos após ser eleito, o Papa Bento 16 está enfrentando críticas cada vez mais frequentes de teólogos, analistas e religiosos dentro e fora da Igreja Católica, que o acusam de ter um estilo recluso e liderar a Igreja de forma autoritária.
Especialistas ouvidos pela BBC Brasil afirmam que decisões tomadas recentemente pelo papa - como a nomeação de um bispo auxiliar conservador na Áustria sem considerar o parecer do episcopado local - são sinais de um papado centralizador e pouco democrático.
Uma das decisões controvertidas de Bento 16, na opinião dos especialistas, foi nomear o ultraconservador Gerhard Maria Wagner como bispo auxiliar de Linz, sem ouvir as considerações do episcopado local. Wagner renunciou duas semanas depois devido a fortes pressões causadas por declarações suas, como a de que homossexuais deveriam ser "curados" e de que o furacão Katrina foi um "castigo de Deus" pelas clínicas que praticavam aborto em Nova Orleans.
Em outra decisão considerada polêmica, Bento 16 suspendeu a excomunhão de quatro bispos da ordem tradicionalista Pio X. Os religiosos haviam sido ordenados sem autorização da Santa Sé em 1988 pelo francês Marcel Lefebvre, criador de uma irmandade que não reconhece as reformas propostas no Concílio Vaticano II, introduzido no final dos anos 60.
"A questão (da reabilitação) dos lefebvrianos representa a superação de um limite. É como se a lua de mel da igreja católica com o papa tivesse acabado", disse à BBC Brasil o professor de História do Cristianismo, Alberto Melloni.
"O papa tem um estilo solitário e absolutista de governar. Não aceita conselhos, opiniões e críticas e isto cria problemas, inclusive nos setores moderados da igreja", afirmou, em entrevista à BBC Brasil, o vaticanista Marco Politi, que acabou de publicar o livro A Igreja do Não, pela editora Mondadori.
A suspensão da excomunhão dos "lefebvrianos" por Bento 16 causou ainda grande mal estar nas igrejas da Alemanha, Áustria, Suíça e França.
Um dos bispos perdoados, Richard Williamson, foi obrigado pelo governo a deixar a Argentina depois de negar publicamente o extermínio de judeus durante o regime nazista.
Williamson, que estava radicado na Argentina desde 2003, chegou a Londres nesta quinta-feira.
Estilo de governo
Em entrevista ao jornal Le Monde nesta semana, o teólogo dissidente suíço Hans Kung também criticou o estilo de governo do papa.
Kung, que foi professor da Universidade alemã de Tubinga com o então cardeal Joseph Ratzinger nos anos 60, disse ao jornal que "Bento 16 viajou muito pouco e sempre viveu em ambiente eclesiástico, fechado no Vaticano - que é uma especie de antigo Kremlin - onde fica protegido das críticas".
"Ele não foi capaz de entender o impacto que teve uma decisão destas (a suspensão da excomunhão) e seu secretário de Estado, o cardeal Tarcisio Bertone, é totalmente submisso. Estamos diante de um problema de estrutura".
Segundo Kung, Ratzinger defende a idéia do "pequeno rebanho" - poucos fiéis e uma igreja elitista, formada por "verdadeiros católicos".
"É uma ilusão pensar que é possível continuar assim, sem padres nem vocações. A Igreja corre o risco de se tornar uma seita", afirma.
Assessores
Melloni, que também é especialista no Concílio Vaticano II e presidente da Fundação de Ciências Religiosas João 23, de Bolonha, concorda com o teólogo suíço.
"O risco de se tornar uma seita é um problema real", disse ele à BBC Brasil.
Para Politi, o pontificado de Bento 16 está acumulando problemas.
"Em vez de um pontificado de transição, este pode ser um papado de estagnação, em que se acumulam problemas e tensões dentro da Igreja e entre a Igreja e o mundo moderno".
Alguns observadores, entretanto, acreditam que Bento 16 não é de todo responsável pelas polêmicas. Para eles, o problema é o tradicional mecanismo de funcionamento da Cúria Romana.
A professora de Sociologia da Religião da Universidade la Sapienza de Roma Maria Immacolata Maciotti lembra que o papa tem opiniões próprias consideradas fortes. A questão, segundo ela, é que o aparato em torno de Bento 16 - que normalmente impediria a tomada de decisões polêmicas - não tem funcionado bem.
"O impulso de perdão do pontífice (aos lefebvrianos) deveria ser freado pelos conselheiros atentos a estes problemas. Isto não ocorreu. Podemos supor que o papa é muito autoritário ou não tem pessoas capazes em torno de si", afirmou em entrevista à BBC Brasil.
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