domingo, 3 de abril de 2011

Quando matar se torna prazer


Em fevereiro de 2009, o então recém-empossado presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, determinou o envio de um reforço de 17 mil soldados para o Afeganistão. O novo contingente teve por base duas grandes formações: a 2 Brigada Expedicionária de Fuzileiros Navais, sediada em Camp Lejeune, Carolina do Norte, e a 5 Brigada Stryker da 2 Divisão de Infantaria, de Fort Lewis, Washington. Aproximadamente um ano depois, um grupo de soldados desta segunda formação viria a ser protagonista de um dos casos mais nefastos e brutais de violação dos direitos humanos ocorridos em quase dez anos de guerra no país asiático.

Ao longo dos primeiros cinco meses de 2010, um pelotão da 5 Brigada Stryker, que opera em Kandahar, no Sul afegão, teria assassinado, de forma aleatória e gratuita, civis afegãos desarmados. Além disso, o grupo é acusado de mutilar vários dos cadáveres em um remoto vilarejo da região, chamado de Mohammad Kalay. Não satisfeitos, os militares do denominado "Time da Morte" registraram a matança em dezenas de fotos, tendo chegado a postar algumas delas em sites de relacionamentos da Internet.

Segundo informação da revista norte-americana Rolling Stone, antes de os crimes de guerra tornarem-se públicos o Pentágono tomou medidas extraordinárias para suprimir as fotos da rede - desenvolvendo um enorme esforço para encontrar todos os arquivos e neutralizá-los antes que pudessem deflagrar um escândalo na escala que marcou os casos de tortura a prisioneiros iraquianos por soldados estadunidenses na prisão de Abu Ghraib, localizada em Bagdá.

Muitas destas imagens - cerca de 150 delas -, porém, foram obtidas e divulgadas pela Rolling Stone e pela revista alemã Der Spiegel. A publicação norte-americana chegou a disponibilizar as fotos em seu website, juntamente com uma reportagem especial sobre o assunto, datada de 27 de março e assinada pelo jornalista Mark Boal. Segundo a Rolling Stone, as imagens "retratam a cultura de uma linha de frente entre as tropas dos EUA em que a morte de civis inocentes é vista como motivo de comemoração".

Assim que a publicação alemã Der Spiegel chegou às bancas, no dia 21, a secretária de Estado Hillary Clinton teria telefonado ao governo afegão para falar sobre o caso. "A maioria das pessoas dentro da unidade não gostava do povo afegão", disse um dos soldados aos investigadores do Exército depois que os crimes vieram à tona. "Toda mundo diria que eles são selvagens."

"O plano era atirar para matar"

O soldado Jeremy Morlock, de 22 anos, declarou-se culpado perante a corte marcial que o julgou em 23 de março passado pela morte de três civis afegãos, crime vinculado às ações do "Time da Morte". O jovem militar, como parte de um acordo que lhe garantiria uma sentença máxima de 24 anos de prisão, também se disse culpado em outras três acusações: conspiração, obstrução à Justiça e uso de drogas. Morlock teria liderado o pelotão envolvido nos três assassinatos, ocorridos nos meses de janeiro, fevereiro e março de 2010. Ao ser questionado pelos juízes se o plano era disparar com o objetivo de assustar os civis, ele foi taxativo: "Não, o plano era atirar para matar".

Morlock foi o primeiro de cinco soldados da Brigada Stryker a se submeter à corte marcial. Após o assassinato de janeiro de 2010, outro réu, o soldado Adam Winfield, do mesmo pelotão, enviou mensagens no Facebook aos seus pais dizendo que seus colegas no Afeganistão haviam executado um civil e tinham a intenção de matar outros, em uma clara indicação de que os crimes foram planejados. Winfield acrescentou que o grupo o advertira a silenciar sobre o assunto. O pai do jovem militar chegou a alertar um sargento de Fort Lewis, mas nenhuma medida foi tomada até maio, quando outra testemunha, em uma investigação sobre o consumo de drogas na unidade, reportou os assassinatos dos civis afegãos na província sulista.

Winfield é acusado de envolvimento no terceiro assassinato. Ele alega ter sido ameaçado de morte pelos companheiros caso não disparasse contra o civil afegão. Os demais acusados são os soldados Andrew Holmes e Michael Wagnon II e o sargento Calvin Gibbs, o único deles a afirmar que os mortos não eram civis, e sim combatentes talibãs.

Fonte: Correio do Povo

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