Por Pedro Doria, para Canal Meio (canalmeio.com.br)
De tempos em tempos, fechados em seus gabinetes, generais do Exército
concluem que têm o direito de decidir quem governará o Brasil. De 1889
para cá, aconteceu mais de uma dezena de vezes. Em seis delas, os
oficiais tiveram sucesso. Esta é a história de cada um destes seis
golpes de Estado. E de um que fracassou.
1889
O marechal Deodoro da Fonseca estava doente, tomado por uma crise
asmática, na manhã de 15 de novembro, em 1889. Ainda assim sua casa foi
tomada por militantes republicanos que o puseram num coche. Deodoro, de
mau humor. Ao chegar ao Campo de Santana, onde trabalhava o
primeiro-ministro, visconde do Ouro Preto, Deodoro deixou a carruagem,
montou a cavalo, entrou no palácio, derrubou o premiê dizendo poucas
palavras e voltou para casa onde se trancou sem querer receber mais
ninguém.
Em momento algum deixou claro se havia derrubado só o gabinete ou se havia encerrado também a monarquia brasileira.
O imperador dom Pedro II, àquela altura, estava longe do Rio, na
cidade de Petrópolis, quando recebeu no fim da manhã um telegrama de
Ouro Preto informando de sua deposição. Tomou um trem para a capital e,
do palácio imperial, mandou convocar Deodoro. Que o ignorou.
Amanheceu o 16 de novembro com sua residência cercada por soldados armados.
A história dos golpes brasileiros é marcada por muitos eufemismos. O
de 1964 foi por anos chamado de ‘revolução’, atualmente os militares
preferem trata-lo por ‘movimento’. O de 1889 éestá nos livros como
‘proclamação da República’. Alguns dos golpes militares em nossa
história foram organizados. Os generais se reúnem, combinam o jogo,
destituem o governo e encerram a Constituição. Outros foram confusos,
com bateção de cabeças, planos vagos, nenhum acordo claro. Acabaram
dando certo mais por omissão dos governantes que decidiram não resistir.
Foi, igualmente, o caso de 1889 e 1964.
As Forças Armadas brasileiras se formaram profissionalmente a partir
da Guerra do Paraguai e saíram com prestígio. Mas este prestígio não foi
retribuído pelo Império na forma de salários e poder. Ao mesmo tempo,
principalmente na elite agrária, em fins da década de 1880 havia
insatisfação com a abolição da escravatura. As duas forças políticas
levaram ao golpe desajeitado que tornou o Brasil uma república e pôs em
seu comando um marechal.
1891
Mas era um inepto, Deodoro, como governante. A inflação disparou e
ele não conseguiu garantir apoio político. Em 1891, o Congresso entregou
uma Constituição para a República e, por uma margem tênue, elegeu
indiretamente Deodoro, o que deveria consolidá-lo na presidência. Tinha,
porém, a oposição de boa parte dos integrantes do movimento
republicano. Numa situação de instabilidade, com líderes políticos
regionais ameaçando pegar em armas contra o governo, o marechal tomou a
decisão de fechar o Congresso Nacional. Foi o Golpe de 3 de novembro.
Só que havia um problema: ele não contava com a lealdade do Exército.
Quem tinha este apoio era Floriano Peixoto, também marechal, seu
vice-presidente, e número dois das Forças Armadas desde os tempos do
imperador. Em 23 daquele mês, os navios atracados na Baía de Guanabara
voltaram seus canhões para a capital e ameaçaram bombardear a cidade
caso Deodoro não renunciasse.
Renunciou, pois, tendo perdido tanto Exército quanto Marinha. Dois
golpes seguidos, um após o outro. A República demorou décadas para se
estabilizar. Inúmeros movimento armados eclodiram. Alguns populares,
outros de suboficiais, muitos rurais, tantos urbanos. Mas aquela
instabilidade institucional que marcou o período entre 1889 e 91 passou
por um tempo.
Ao menos, até os militares começarem a questionar novamente os civis.
Um golpe fracassado
No início da tarde de 6 de julho, em 1922, ainda antes das 14h, 28
militares deixaram o Forte de Copacabana, no Rio de Janeiro, em direção
ao palácio presidencial no Catete. Quatro tenentes, os outros soldados,
haviam decidido por um suicídio ritualizado. Pouco mais de um dia antes,
na madrugada de 5, havia sido tentado um levante militar para derrubar
do poder o presidente Epitácio Pessoa. O líder golpista era um
ex-presidente: o marechal Hermes da Fonseca. Sobrinho de Deodoro e o
mais condecorado militar do Exército brasileiro. Mas durante uma noite
confusa, o levante na Vila Militar havia fracassado e os oficiais
amotinados foram presos. Dentre eles, o tenente Arthur da Costa e Silva.
Àquela altura, dentre os rebeldes, só haviam sobrado aqueles 28 do
Forte de Copacabana. Pois decidiram não se render e marchar contra o
Palácio do Catete plenamente conscientes de que no caminho seriam
interceptados por tropas leais ao presidente.
Pois foram.
Não se sabe quantos deles chegaram à rua Barroso — alguns foram
perdendo a coragem e fugindo pelo caminho. Eram mais de dez,
possivelmente menos de 15, mas a história registrou um número mítico. Os
Dezoito do Forte. Pois foi àquela altura que soou o primeiro tiro,
abatendo um praça que caiu imediatamente morto. Os homens se atiraram na
praia, buscando proteção na mureta de concreto que separava a pista da
areia. Por mais de uma hora, aquela dezena e pouco resistiu ao assédio
de mais de mil soldados. Quem viu lembra que parecia chover no mar de
tantas balas que caíam. Foi um massacre — sobraram vivos apenas dois,
muito feridos. Os tenentes Antonio Siqueira Campos e Eduardo Gomes. Anos
depois, a rua Barroso teria seu nome trocado pelo de Siqueira.
Os Dezoito do Forte deram início a uma onda de revoltas que tomariam o
país nos anos seguintes e o movimento ganharia nome. Tenentismo.
Aqueles tenentes como Siqueira, Gomes e Costa e Silva eram formados pela
turma admitida em 1918 pela Escola Preparatória de Oficiais do
Realengo, que anos depois seria substituída pela Academia Militar de
Agulhas Negras. Foram, eles, os primeiros oficiais formados
profissionalmente pelo Exército Brasileiro, com uma escola própria de
nível universitário. Siqueira e Gomes foram líderes importantes do
movimento, junto de Luís Carlos Prestes, Juarez Távora e João Alberto
Lins e Barros.
Sua geração consolidou a convicção que herdou dos oficiais que os antecederam.
O princípio era simples: militares são formados para dar a vida à
nação. São disciplinados. Têm apenas os interesses do país em mente.
Nenhuma instituição, portanto, é mais leal ao Brasil do que as Forças
Armadas. Quando os políticos traem o país, em nome da pátria são
militares que têm o dever de salvá-la. Ao longo dos anos 1920 este modo
de pensar impregnou nas Forças Armadas. E, nos três golpes de Estado que
marcaram as décadas seguintes, líderes tenentistas estiveram
envolvidos.
De alguma forma, o espírito democrático nunca pegou nas Forças
Armadas. O atual discurso de generais contra o Supremo Tribunal Federal
deixa isto claro.
1930
Na manhã de 24 de outubro, em 1930, deixaram o mesmo Forte de
Copacabana um grupo de oficiais liderados por dois generais — Augusto
Tasso Fragoso e João de Deus Mena Barreto. Desta vez, não encontrariam
qualquer resistência. Ambos estavam numa conversa permanente desde a
véspera. Mena havia procurado Tasso para lhe informar que, em discussões
com outros generais, haviam concluído que o presidente Washington Luís
Pereira de Souza não tinha mais condições de governar. “Já se achavam
articulados os elementos necessários à pacificação do país”, afirmou.
“Não é justo que Exército e Marinha”, continuou Mena Barreto, “se
aferrem à defesa de um governo que a nação já não suporta. A força
armada é servidora desta e não daquele.”
Àquela altura, tropas rebeladas compostas por soldados e policiais
militares, que tinham entre os líderes Eduardo Gomes e João Alberto,
estavam no Paraná prestes a avançar sobre São Paulo. Siqueira Campos
havia morrido afogado meses antes e por isso não caminhava com os
antigos companheiros. Prestes se juntara aos comunistas e assim escolheu
outro caminho. Aquelas topas, não. Sua intenção era colocar no governo o
governador gaúcho Getúlio Dornelles Vargas. E era tendo em mente este
avanço rebelde que o alto-comando do Exército tomou sua decisão. Ao
invés de proteger o presidente e a Constituição, precipitaria sua queda.
Ao chegar ao palácio presidencial, os dois generais já traziam
consigo o contra-almirante Isaías de Noronha, representando a Marinha.
(A Aeronáutica ainda não havia sido formada.) Apenas na véspera,
irritado, Washington Luís havia proibido seus auxiliares de trazerem a
ele as histórias que circulavam na capital de que um golpe de Estado
estava em marcha. Havia se convencido de que eram boatos, de que o
Exército lhe era fiel. Os três oficiais entraram no palácio e pediram
que o presidente fosse informado de sua presença. Então se sentaram. E
esperaram. Àquela altura, por ordens suas, o palácio já estava cercado.
Washington Luís podia ter se movido ao autoengano até aquela manhã, mas
já não era mais possível. E, ainda assim, não mandava entrar aqueles
oficiais. Os três homens esperaram. E esperaram. Até que desistiram. Se
levantaram, atravessaram salas uma após a outra, e simplesmente abriram a
porta do presidente. Encontraram-no de pé à cabeceira da mesa, com
todos seus ministros também de pé.
“Disse-lhe que ele de certo compreenderia o nosso pesar de sermos
obrigados a assumir aquela atitude”, escreveu mais tarde Tasso Fragoso.
“Naquele momento só uma coisa me preocupava, a vida dele”, registrou não
sem um quê de cinismo. “É a única coisa que não me preocupa”, respondeu
o presidente. Mas, com o palácio cercado e aqueles dois generais mais
um contra-almirante à frente, não havia escolha. Horas depois,
Washington Luís deixou o prédio num automóvel.
A imagem foi registrada por um jovem repórter que havia recebido a
notícia de que aquele golpe estava em curso. Roberto Marinho fez ali a
foto que se tornou o mais importante furo de sua carreira.
Quando Getúlio enfim chegou ao Rio, Tasso, Mena e Noronha ocupavam o governo federal e o repassaram ao novo presidente.
1937
Foram anos intensos e confusos os primeiros de Vargas no poder. A
Primeira República caiu, Washington Luís foi exilado, e em 1932 São
Paulo se levantou rebelada. O presidente gaúcho tomou o poder derrubando
um presidente paulista, alijara a elite daquele estado e havia
prometido uma Assembleia Constituinte. Não aconteceu. A guerra civil
veio e foi, deixando quase dois mil mortos, a Constituinte então foi
entregue e, em 1934, o país ganhou a Constituição mais democrática que
teve até chegar a de 1988. Entre outros temas, determinava eleições
presidenciais para dali a quatro anos.
É só que, quando a campanha eleitoral já estava em curso e chegava o
segundo semestre de 1937, Getúlio Vargas não se sentia ainda disposto a
ceder o poder. Apenas um novo golpe de Estado, que pusesse abaixo mais
uma Constituição, poderia lhe garantir isso. Só que golpes exigem
justificativas. Em 1930, havia exaustão com os fracassos do regime que
durava já desde o primeiro presidente eleito, sucessor de Floriano
Peixoto. Em 1937 seria necessário contar uma história e ela veio na
forma de uma mentira. O Plano Cohen.
Naquele ano, um jovem coronel chamado Olímpio Mourão Filho redigiu um
plano que indicava como uma revolução comunista poderia acontecer no
Brasil. Mourão Filho não era comunista — na verdade, estava num lugar
ideológico diametralmente oposto. Era o número dois da milícia fascista
da Ação Integralista Brasileira. Ao longo da vida, o coronel disse que
escreveu o texto como um estudo para ter um cenário sobre o qual pudesse
pensar a defesa do país perante aquele levante.
Em 1937, a possibilidade de um levante comunista não era apenas
hipotética. Apenas dois anos antes, Luís Carlos Prestes havia liderado a
Intentona, justamente uma tentativa de revolução financiada pela União
Soviética de Josef Stálin. Foi mal planejada e um fracasso completo, mas
o alerta estava aceso. E dois generais, justamente os dois mais
graduados do Exército, levaram a Getúlio o plano e tomaram a decisão de
divulga-lo como se fosse verdadeiro. Eram Pedro de Góes Monteiro e
Eurico Gaspar Dutra.
O Congresso Nacional era, principalmente, liberal. Góes Monteiro e
Dutra, porém, começavam a sugerir que sua composição tinha disfarçados
traços comunistas. Em 28 de setembro de 1937, o presidente Getúlio
Vargas recebeu uma delegação de generais. “É preciso agir, mesmo que
fora da lei, mas em defesa das instituições”, lhe disse um deles. O
político gaúcho assentiu. Mas não bastava o apoio militar, o presidente
considerou que precisava ter certeza de que políticos o suficiente
apoiariam uma medida de força. No final de outubro, enquanto o Plano
Cohen era badalado pelas ondas de rádio e páginas de jornais, encaminhou
ao Congresso o pedido de que fosse decretado Estado de Guerra. É quando
certos preceitos constitucionais são suprimidos porque o país está sob
ameaça externa. Quando deputados e senadores o aprovaram, Getúlio teve a
confirmação de que seu golpe não teria resistência.
Na madrugada de 10 de novembro de 1937, as Forças Armadas cercaram o
prédio do Congresso Nacional. Inúmeros parlamentares foram presos.
Naquela manhã, Getúlio apresentou uma nova Constituição. Tinha por
apelido a Polaca, por ter sido inspirada na Carta polonesa. Fascista.
1945
Em finais de 1943, estava ficando já claro que os Aliados venceriam a
Grande Guerra. Com o fim do conflito na Europa, era inevitável que uma
mudança de rumos precisaria ocorrer no Brasil. A Ditadura do Estado Novo
teria de ceder espaço a uma democracia. Sempre hábil, Getúlio tinha
planos de ser seu próprio sucessor. Para isso, pôs a máquina do Estado a
serviço de cultivar sua imagem e construir uma base popular que pudesse
elegê-lo no voto. Assim, do flerte aberto com a direita na década
anterior, começou a reconstruir sua imagem à esquerda. Em 1º de Maio de
1943, anunciou o decreto-lei 5.452, que consolidava as Leis do Trabalho.
CLT. Formalizava regras para criação de sindicatos, consolidava a carga
horária de 8 horas, seis dias por semana, barrava o trabalho infantil,
estabelecia o salário mínimo e uma estrutura previdenciária para
aposentadoria.
Era um golpe de mestre. Se por um lado consolidava direitos
trabalhistas despertando a fidelidade de operários da indústria que
nascia, por outro submetia os sindicatos à pesada influência do Estado,
afastando os comunistas. Ao fazer com que o Estado repassasse dinheiro
para que os sindicatos se sustentassem, criava uma dependência que lhe
garantia influência.
Mas conforme 1945 se aproximava, Getúlio não se anunciava candidato.
Incentivava o surgimento, na sociedade, de um movimento em seu apoio.
Queria ser alçado ao poder. Àquela altura, já haviam se formado três
grandes partidos políticos. Dois deles, por suas mãos. Um, o PTB, seria o
seu, concentrando funcionários públicos e operários. O PSD reuniria os
chefes políticos regionais. A UDN era da oposição, composta por liberais
e conservadores. Eurico Gaspar Dutra, que havia sido seu ministro da
Guerra e parceiro no golpe de 1937, era o candidato do PSD. O agora
brigadeiro tenentista Eduardo Gomes era o candidato da UDN, de oposição.
Se o PTB teria candidato seguia em aberto — mas todos sabiam que
Getúlio se organizava para ocupar o posto.
Em 28 de outubro daquele ano, o chefe da polícia da capital, João
Alberto Lins e Barros, foi informado de que seria substituído no cargo
por Bejo Vargas, irmão do presidente. No mesmo momento, informou ao
general Cordeiro de Farias da mudança. Os dois haviam sido companheiros
de Tenentismo, líderes da Coluna Prestes. Cordeiro havia também
comandado a Força Expedicionária Brasileira durante a Guerra. Para os
dois, estava claro. Quando pôs o irmão no comando da segurança da
capital, Getúlio estava planejando algo. Pois Cordeiro de presto
procurou Góes Monteiro — e os generais foram conversando entre si.
Em 29 de outubro de 1945, Cordeiro de Farias e Góes Monteiro entraram
no gabinete presidencial e comunicaram Getúlio de que as Forças Armadas
não o desejavam mais como presidente.
1964
O gaúcho João Belchior Marques Goulart era herdeiro político de
Getúlio Vargas. Vice, havia assumido a presidência após a renúncia
surpreendente de Jânio Quadros, em 1961. Governou com o país em crise
econômica, inflação e com um certo desajeito — não tinha a habilidade
política do padrinho. E havia escolhido um duplo confronto. Com o
Congresso Nacional, onde abriu mão de adquirir apoio. Também contra o
alto-comando do Exército, decidindo insuflar um levante de suboficiais.
Enquanto isso, uma onda conservadora tomava a classe média,
principalmente em São Paulo, que se organizava em marchas contra o
governo. Simultaneamente, líderes comunistas de um lado, e o governador
gaúcho Leonel Brizola do outro, faziam discursos defendendo justamente
que Jango partisse para a briga. Que acirrasse a disputa. As vozes
pedindo moderação ao seu lado eram poucas, mas dentre elas pesava a do
líder governista na Câmara, Tancredo Neves. O deputado acreditava que
contornar a crise era possível, caso o governo decidisse botar panos
quentes.
Se em 1937 era possível dizer que os soviéticos realmente tinham
planos de uma revolução comunista, no Brasil, não havia qualquer indício
real disso em 1964. Mas, se aproveitando da radicalização do discurso
de Brizola e dos comunistas, a direita defendia que o país corria risco
real.
E, entre a busca do diálogo defendida por Tancredo e do confronto proposta por Brizola, Jango ficou com o segundo.
Se nos golpes de 30, 37 e 45 havia se formado um rápido consenso no
alto-comando do Exército, em 1964 não foi exatamente assim. As conversas
ocorriam. Envolviam o marechal da reserva Cordeiro de Farias, os
generais quatro estrelas Orlando Geisel, Humberto Castello Branco,
Arthur da Costa e Silva. Todos eram conspiradores profissionais desde os
anos 1920 e já haviam planejado golpes não concretizados em 1954 e 55.
Não conseguiam chegar, porém, a um acordo claro.
Desta vez, não houve uma comissão de generais entrando pelo gabinete presidencial para comunicar o fim do governo.
Na madrugada de 31 de março, começou a se espalhar a notícia de que o
agora general Olympio de Mourão Filho havia levantado suas tropas, em
Juiz de Fora, e tomara o rumo do Rio de Janeiro para dar um golpe. Nunca
aconteceu, mas os boatos eram convincentes e ninguém o negava. Naquela
tarde, Castello, chefe do Estado-Maior do Exército, se isolou em um
apartamento de Copacabana e passou a tarde em telefonemas para seus
pares. Os generais golpistas eram muitos, mas de telefone em telefone,
não se entendiam, não chegavam a conclusão alguma. Só que,
diferentemente de Washington Luís 34 anos antes, Jango acreditou que o
golpe estava em curso.
E desistiu.
Ao fim de dois dias nos quais havia pouca informação, muitos boatos e
nenhum acordo, o presidente tomou um avião para o Rio Grande do Sul e o
presidente do Senado tomou o microfone no plenário da Câmara, em sessão
conjunta do Congresso.
Sem base legal, declarou vaga a presidência da República.
Seis golpes concretizados com a participação do alto-comando do
Exército brasileiro. E o fantasma está sendo atiçado novamente. Não
custa dizer: o número de golpes planejados e nunca levados adiante, ou
mesmo fracassados, é maior do que os de sucesso.
As histórias registradas por aqui foram colhidas dos livros
Washington Luís, de Célio Debes; Getúlio 1930—1945, de Lira Neto; A
Ditadura Envergonhada, de Elio Gaspari.
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