quinta-feira, 7 de junho de 2018

Israel queria política, não futebol


O governo Netanyahu quis política em vez de futebol, e teve o que desejou. Futuramente, também terá que decidir se quer Trump e, com isso, o unilateralismo, ou se aposta na comunidade internacional, opina Martin Muno.

Deutsche Welle

O último amistoso da seleção de Israel em Jerusalém aconteceu em 9 de outubro de 2017. Contra a Espanha, a equipe perdeu uma morna partida eliminatória para a Copa do Mundo por 1 a 0. Pode ser que a derrota seja o último jogo de seleções disputado em Jerusalém por algum tempo.

O amistoso marcado para o próximo sábado (09/06) na cidade, entre Israel e Argentina, foi suspenso. Os jogadores argentinos não queriam comparecer, já que radicais palestinos protestaram com veemência diante do centro de treinamento da equipe em Barcelona, levantando camisas da seleção sul-americana manchadas com tinta vermelha. Além disso, veículos da imprensa argentina relataram sobre ameaças pessoais contra a estrela do time, Lionel Messi, e sua esposa.

É compreensível que a equipe argentina não queira jogar sob essas condições e que, eventualmente, não queira colocar em risco a saúde das estrelas do time tão pouco tempo antes da Copa. Também dá para entender a decepção dos torcedores israelenses, que estavam ansiosos para ver o atual vice-campeão mundial em campo.

Menos compreensível é a transferência da partida de Haifa – onde deveria ter acontecido originalmente – para Jerusalém, aparentemente após intervenção da ministra israelense do Esporte, Miri Regev, que pertence à ala de extrema direita do partido governista Likud. "Miri Regev queria política em vez de futebol – e, agora, recebeu política. Quem paga o preço são os torcedores", comentou, de maneira resumida e certeira, Itzik Shmuli, deputado da União Sionista, da oposição, na Knesset (Parlamento israelense).

É evidente o motivo pelo qual o jogo do ano passado aconteceu sem maiores incidentes, mas a partida planejada para junho deste ano se tornou uma questão política. A causa da agitação é a transferência da embaixada americana de Tel Aviv para Jerusalém, em maio.

A ação catalisada pelo presidente Donald Trump marcou uma guinada decisiva na política dos Estados Unidos para o Oriente Médio e o fim do consenso do Ocidente sobre a solução de dois Estados para o conflito israelo-palestino.

No dia da abertura da embaixada, mais de 50 palestinos morreram durante protestos. Outros 2.800 ficaram feridos. Para a sociedade civil na cidade multicultural e multirreligiosa, isso significa que qualquer evento de proporções maiores tem um peso político.

É que, independentemente do fato de que ameaças de palestinos radicais também precisam ser condenadas, Shmuli tem razão: a liderança israelense sob Benjamin Netanyahu quis política em vez de futebol, e teve o que desejou. Futuramente, o governo também terá que decidir se quer política em vez de cultura. Precisa decidir se apostará em Trump e, com isso, no unilateralismo e no confronto com os palestinos, ou se aposta na comunidade internacional, em negociações e um curso de equilíbrio político.

Mais uma vez, o futebol perdeu a contenda com a política. Algo que, hoje em dia, só surpreende a alienados.

Martin Muno é jornalista da DW

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