sexta-feira, 6 de junho de 2008

O "Gaucho" alemão em guerra com as abelhas do mundo



EcoAgência:

Em 2007 ingressaram no Uruguai 32 toneladas de ‘Gaucho”, um agrotóxico da Bayer recentemente proibido na Alemanha após a morte massiva de colméias.

Por Flavio Pazos*

O governo alemão acaba de ordenar a suspensão imediata das permissões para a utilização de oito agrotóxico devido à morte massiva de abelhas. Um dos agrotóxicos proibidos foi o imidacloprid(1), cujas importações no Uruguai, no rastro do boom da soja, aumentaram mais de 7.200% nos últimos sete anos.

A decisão do Escritório Federal de Proteção ao Consumidor e Segurança Alimentar da Alemanha foi tomada logo depois que apicultores desse país denunciaram a morte de dois terços de suas abelhas após a aplicação de agrotóxicos neonicotinoides, entre os quais estão o imidacloprid, um inseticida da companhia de origem alemã Bayer.

Manfre Hederer, presidente da Associação Alemã de Apicultores Profissionais declarou: “Estamos ante uma verdadeira emergência. Entre 50 e 60 por cento das abelhas morreram, e alguns apicultores perderam todas as suas colméias”.

A Bayer é líder mundial em mercado de agrotóxicos. Registrado pela primeira vez em 1992, o imidacloprid é seu inseticida mais vendido. Dada sua alta toxicidade para as abelhas, pouco tempo depois começou a provocar a reação de apicultores em distintas partes do mundo. A recente proibição ao imidacloprid na Alemanha é apenas uma batalha a mais de uma história conflituada.

Uma guerra global contra as abelhas

Em 1995, vários grupos de apicultores dos Estados Unidos levaram a Bayer aos tribunais após perderem milhares de colméias por aplicações de imidacloprid.

Em 1999, após a morte de um terço das abelhas na França, muitos usos do imidacloprid foram proibidos nesse país. Logo depois que o “Comitê Científico e Técnico” formado pelo governo francês declarou que o tratamento das sementes com imidacloprid implicava um risco demasiado alto para as abelhas, as restrições se ampliaram. No ano de 2007 se estabeleceram medidas cautelares proibindo ainda mais usos do imidacloprid ante a morte massiva de abelhas e um juiz processou as direções das multinacionais Bayer por venderem “produtos agrícolas tóxicos daninhos para a saúde do homem ou dos animais”.

Em 2005, os apicultores canadenses denunciaram publicamente as importantes perdas de abelhas relacionadas com os resíduos de imidacloprid aplicado a cultivos de alimentos. As perdas alcançaram entre 50% a 80% das colônias.

O ano passado, seguindo o pedido de Associações de Apicultores de toda a Europa, a parlamentar alemã Hiltrud Breyer apresentou uma moção para a proibição em todo o continente dos neonicotinoides, a família de agrotóxicos a qual pertende o imidacloprid.

Não é um inimigo apenas dos apicultores

Além de perigoso para as abelhas, o imidacloprid é extremamente tóxico, em concentrações muito baixas, inclusive, para algumas espécies de animais aquáticos e para os microorganismos da terra. A toxicidade aguda do imidacloprid pode ser muito alta para algumas espécies de aves, provocando o adelgaçamento da casca dos ovos e reduzindo a produção ovos e o descasque dos mesmos.

Ainda que considerado relativamente pouco tóxico para os seres humanos, muito menos é inócuo. A uma exposição aguda à formulação agrícola do imidacloprid podem apresentar-se sintomas como a redução da atividade, a falta de coordenação motora, tremores, diarréia e perda de peso. Alguns desses sintomas podem prevalecer até 12 dias após a exposição.

Estudos de toxicidade crônica tem demonstrado que a tireóide em especial é sensível aos resíduos de imidacloprid nos alimentos e foi comprovado que causa impactos negativos na reprodução.

Como se ainda fosse pouco, a sílice cristalina, ingrediente inerte presente nas apresentações comerciais de imidacloprid, está classificada pela Agência Internacional para o Câncer como carcinogênico para os seres humanos.

A situação no Uruguai

No Uruguai se encontram aprovadas para venda mais de 30 formulações à base de imidacloprid. Algumas de suas denominações comerciais são “Gaucho”, “Yunta”, “Bagual”, “Winner” y “Pride”, e podem conter até 60% de princípio ativo.

Um de seus principais usos é a aplicação como “cura-sementes” para controlar as pragas que atacam as plantas de soja recém nascidas.

Dado o processo de sojização que atravessa a agricultura de nosso país, não é de se estranhar que nos últimos anos se tenha registrado uma explosão das importações de imidacloprid (v. tabela).


Durante 2007 ingressaram 32 toneladas deste agrotóxico. Isso significa quase o triplo do que se importou no ano anterior e 72 vezes mais que o que se importou no ano de 2000. Tomando como base esse ano, as importaçõs de imidacloprid aumentaram 7.243%.

Denúncias de apicultores uruguaios

Não é supreendente então que durante o último ano tenha havido várias denúncias de apicultores uruguaios que atribuem a crescente mortandade de suas colméias ao pacote de agrotóxicos associado à soja. Lamentavelmente, nada indica que o boom da soja vá diminuir, pelo que os problemas de mortandade de abelhas serão cada vez mais freqüentes.

A menos que se tomem as medidas necessárias. O imacloprid será proibido no Uruguai ou uma vez mais os sojeiros farão o que querem à custa do restante dos uruguaios? Até quando devemos esperar que se proíba um agrotóxico que não se pode usar em seu país de origem?

*Texto publicado pela Red de Acción en Plaguicidas y sus Alternativas de América Latina (RAP-AL) - Coordenação Uruguay. Tradução de Ulisses A. Nenê para a EcoAgência. Reprodução autorizada, citando-se a fonte.

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