domingo, 29 de outubro de 2017

A inteligência artificial vai mudar o futuro da música?

Fonte: http://picssr.com/


Novo programa gerador de música provoca temores de que compositores se tornem supérfluos. Especialistas discutem aspecto criativo e humano envolvido na produção musical, assim como democratização da indústria criativa.

Especialistas apontam novas possibilidades na música com inteligência artificial
Neste ano, a cantora e personalidade do YouTube Taryn Southern celebrou o lançamento do seu álbum pop "I AM AI", que foi produzido inteiramente com um software de inteligência artificial (AI, na sigla em inglês). Ela usou um programa chamado Amper, um gerador de música open source.

Após fornecer informações como duração, tempo e chave, Southern deixou que o software fizesse a composição e a produção. Depois ela reorganizou as várias partes fornecidas para criar uma música estruturada. Sua estreia foi saudada como o "primeiro álbum produzido inteiramente com um software de inteligência artificial".

Parte de uma nova onda de composição de música AI e startups de produção como Jukeeck, Groov.AI e Humtap, o Amper é um serviço on-demand, que oferece músicas originais baratas e sem royalties para todos, de cineastas a anunciantes.

Como muitas tecnologias revolucionárias, a inteligência artificial gera receios de ruptura e redundância. Para compositores e produtores independentes que criam música original para o mercado publicitário, por exemplo, um aplicativo que pode fazer o mesmo trabalho em um prazo menor e por menos dinheiro é uma perspectiva assustadora.

John Groves, diretor da Groves Sound Communications e um peso-pesado internacional em termos de música para fins comerciais, não está preocupado com a possibilidade de se tornar redundante. Na verdade, ele disse estar "muito animado" com o avanço da inteligência artificial.

"Isso irá causar arrepios na nossa indústria", disse. "Mas temos que dar uma olhada no ritmo e perceber que as novas possibilidades superam os efeitos disruptivos."

Já Nick Collins – autor de uma série de livros sobre música e cofundador da Chord Punch, uma gravadora independente que lança trabalhos com base em algoritmos – lembra antigos temores da indústria musical em relação a novas tecnologias.

"É como o sindicato dos músicos que protestou contra a chegada do MIDI (Interface Digital de Instrumentos Musicais) na década de 1980", observou. "Olhe para todas as possibilidades criativas que surgiram a partir dessa tecnologia."

Valerio Velardo, diretor da Melodrive, startup pioneira da área de música dinâmica para videogames (trilhas sonoras que mudam de acordo com eventos no jogo), afirmou que o mundo está às vésperas da "próxima onda de democratização" dentro das indústrias criativas.

"Hoje em dia todos têm uma câmera digital de alta qualidade em seu telefone, mas isso não significa que os fotógrafos profissionais tenham desaparecido", disse ele. "Acho que será o mesmo com a AI. Duvido que o papel do compositor será prejudicado por esta tecnologia."

Computadores criativos

Mesmo assim, a estreia bem-sucedida da AI dentro da indústria da música pop desafia os preceitos comuns, em especial o de que a imaginação artística e a criatividade são traços inerentemente humanos, que não podem ser reproduzidos por computadores.

Robô vai virar cantor de ópera

"A música representa um desafio", disse à DW Steven Jan, pesquisador de música da Universidade de Huddersfield. "É uma das exigências mais cognitivas, mecânicas e emocionais de todas as atividades humanas, o que dificulta sua criação por um computador. É a última fronteira da AI."

"Ainda estamos em uma fase de criatividade exploratória", disse Velardo, referindo-se à forma como os sistemas AI são capazes de aprender e operar de forma criativa dentro dos limites de um espaço conceitual e, em última instância, imitar estilos de música estabelecidos.

Até o momento, no entanto, a criatividade transformadora, ou a capacidade de criar novos estilos musicais além desses limites conceituais, permanece fora do alcance. Velardo chama isso de "o santo graal da criatividade computacional".

Som humano

Então como a AI afetará a indústria da musical? Será que ela levará a uma maior previsibilidade na música? Collins diz que não, ressaltando que há "um número suficiente de programadores trabalhando em diferentes projetos para criar um ambiente diversificado".

A incorporação de computadores ao processo criativo já permitiu a quebra das divisões de trabalho entre compositores e intérpretes. Embora o advento da música eletrônica e de diferentes softwares já tenham provocado uma enorme onda de democratização do processo de criação, a AI poderia levar esse processo um passo além.

Mas o artista desaparecerá? Pascal Pilon, diretor da Landr, uma startup que usa big data e machine learning (aprendizado automático) para automatizar o processo final de produção musical conhecido como masterização, não pensa assim.

"Música é contar histórias, gostamos da personalidade do artista. Não acho que as pessoas vão querer ouvir música feita exclusivamente por computadores", disse ele.

De fato, a maioria das pessoas que desenvolvem essas tecnologias são compositores. O artista audiovisual e compositor eletrônico vanguardista Ash Koosha disse ao jornal The Guardian: "Estou tentando preparar música digital de uma maneira que ela não perca os valores humanos e não resulte não caminhe numa direção em que você simplesmente deixa a máquina decidir o que é música."

O musicólogo John Blacking escreveu de maneira semelhante em seu livro How Musical Is Man? (sem tradução no Brasil) que a música é, em última instância, "o som humanamente organizado".

Fonte:  http://www.dw.com/

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Inteligência Artificial




Glauco Arbix, desde São Petersburgo

Nos Estados Unidos, as pesquisas sobre inteligência artificial (IA) vêm de longe. Mas aceleraram de modo extraordinário nos últimos cinco anos, por conta da velocidade dos computadores, do aumento de sua capacidade de armazenamento, da queda de seu custo e, principalmente, pela sofisticação de sua pesquisa. Os avanços atuais ocorrem nas universidades, em empresas de alta tecnologia como o Facebook, Amazon, Apple, Google, IBM mas também em empresas industriais, como a Tesla e Nvidia.

Em sintonia com essa trajetória, o Conselho de Estado chinês anunciou em julho seus planos para fazer da China o principal centro de Inteligência Artificial em 2030. Empresas como a Baidu, Alibaba e Tencent, que já tinham foco em IA, serão agora mais incentivadas e vitaminadas pelo Estado.

Na mesma linha, a Rússia revelou suas intenções com a IA em setembro. O presidente Vladimir Putin afirmou que a “inteligência artificial é o futuro, não só da Rússia, mas também da humanidade”. E cravou as intenções do estado russo de se destacar na disputa nesse campo do conhecimento, tido como pré-condição para comandar o mundo.

O ponto central é que as novidades ligadas a IA atingem as pessoas diariamente, com dispositivos cada vez mais precisos de reconhecimento de imagens, voz, de face, de tradução, de captação de tendências e até mesmo de identificação do gosto de cada um. Áreas como a saúde, transporte, varejo, bancos, energia, manufatura e agricultura já vem sendo desestabilizadas por muitos desses avanços, que prenunciam tempos difíceis para aqueles que insistem em permanecer céticos em relação ao potencial da IA. Empresas de todo tipo e porte, instituições como as universidades e os governos estão instados a se envolver na geração e ampliação desse corpo de conhecimento, principalmente porque há questões de fundo ligadas à IA que não encontram resposta fácil. Questões caras a qualquer sociedade, já que envolvem transformações na economia, em valores éticos, legais, regulatórios, além de incidirem fortemente sobre pobreza, desigualdade, privacidade, emprego e renda, para não citar a educação, calcanhar de Aquiles do nosso país e fundamental para a imensa maioria dos trabalhadores.

Com essas preocupações, aqui de São Petersburgo vejo o professor Alexi Samsonovich do Departamento de Cibernética do Instituto de Engenharia e Física de Moscou, declarar que os pesquisadores russos estão no limite de anunciar um “major breakthrough” em IA.

Os ares são de segredo, mas o tema de máquinas emocionalmente inteligentes frequenta as conversas. Samsonovich já havia feito anúncio semelhante em Nova Iorque, há algumas semanas. O que se sabe é que ele e sua equipe desenvolvem atualmente um Ator Virtual, que seria capaz de planejar, fixar objetivos e apresentar caminhos para ampliar a relação entre as pessoas. A ver, pois os resultados podem se mostrar como mais uma promessa não cumprida da IA.

O instigante, porém, é a disposição existente para enfrentar desafios ambiciosos, o que é fonte de energia e de atração de uma legião de jovens pesquisadores que passam a trabalhar com os olhos no futuro.

Como brasileiro, confesso que sinto um pouco de inveja desse entusiasmo. O Brasil poderia fazer muito mais nesses domínios com a qualificação de seus pesquisadores. Nos tempos de hoje nosso país se perde e atira no próprio pé com os cortes indiscriminados em Ciência, Tecnologia e Inovação, como vem ocorrendo. É uma pena. Como na época do boom da microeletrônica, o Brasil corre o risco de perder mais uma grande oportunidade de dar um salto.

Minha universidade, a USP, com certeza poderia concentrar esforços e reunir pesquisadores e pesquisadoras das engenharias, da matemática, física, de todas as humanidades na construção de um grande polo de Inteligência Artificial, fundamental para animar redes no Brasil e no exterior.

Seria bom se os candidatos a reitor da USP, em meio ao processo eleitoral que culminará com a eleição no final deste mês, pelo menos piscassem como sinal de simpatia pelo tema. É a forma concreta de se batalhar pela valoração da pesquisa, sem se perder nos meandros da ideologia, como o meio mais eficaz de se colocar a USP no mesmo nível que as grandes universidades do mundo.

Outubro de 2017