quarta-feira, 1 de setembro de 2010

'Aventura imperialista' no Iraque encolheu poder dos EUA


John Simpson
Editor para Assuntos Internacionais da BBC News

O governo americano encerrou oficialmente sua missão de combate no Iraque à meia-noite de terça-feira.

Em fevereiro de 2003, às vésperas da invasão do país pelas tropas americanas, um importante aliado do então presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, escreveu em um jornal britânico:

"Este é o nosso momento de Império". E seguiu argumentando que os britânicos não tinham o direito de criticar os Estados Unidos por fazer o que eles próprios haviam feito com tanto entusiasmo um século antes.

Mas o momento imperialista dos Estados Unidos não durou muito. E agora, sete anos mais tarde, o país é criticado por quase tudo o que acontece no Iraque.

A opinião pública está dividida igualmente entre os que estão felizes com a partida americana e os que os criticam por sair tão cedo, deixando o Iraque vulnerável a mais violência sectária.

Como sempre ocorre em ocupações, o invasor - nesse caso, os Estados Unidos - não consegue fazer nada certo, nem mesmo sair do país ocupado.

A maioria dos argumentos favorável à invasão em 2003 se esvaziaram.

Muitos iraquianos aprovaram a derrubada de Saddam Hussein. De acordo com uma pesquisa feita pela BBC em 2004, 50% consideraram a invasão uma liberação. Outros 50% consideraram a operação uma ocupação.

Hoje, no entanto, é difícil encontrar quem veja os Estados Unidos como um amigo ou mentor do Iraque.

E a derrubada de Saddam Hussein não provocou, como previam os defensores da invasão, um efeito dominó em prol da democracia nos países do Oriente Médio.

Muito pelo contrário: a posição dos Estados Unidos no Oriente Médio foi visivelmente erodida.

Corrupção e Má Administração

Algumas das medidas adotadas pelas autoridades americanas instaladas na Zona Verde, em Bagdá, foram sóbrias, positivas e práticas.

Outras, como por exemplo a Constituição que os americanos pressionaram o país a adotar, representam um entrave que dificulta a criação de um governo decente no Iraque.

A equipe de administradores instalada na Zona Verde foi formada às pressas, entre 2002 e 2003, sob supervisão do ex-secretário da Defesa dos Estados Unidos, Donald Rumsfeld - um homem sem qualquer interesse em construir nações.

Como resultado, casos de corrupção e má administração atingiram níveis grotescos.

Rumsfeld recebeu do Departamento de Estado americano um relatório de 900 páginas contendo planos cuidadosamente detalhados para o período posterior à invasão. Segundo relatos, ele teria jogado o pacote, ainda fechado, direto na lata de lixo.

Quando o ministro das Relações Exteriores da Arábia Saudita perguntou ao ex-vice de Bush, Dick Cheney, por que os Estados Unidos insistiam em seguir em frente com a invasão, Cheney respondeu: "Porque dá para ser feito".

O problema, no entanto, começou bem mais acima.

Um respeitado dissidente iraquiano, que mais tarde se tornou vice-presidente, descreveu seu choque ao descobrir, algumas semanas antes da invasão, que o presidente Bush parecia não saber que os muçulmanos no Iraque estavam divididos entre xiitas e sunitas.

Generais americanos pareciam sem esperanças de encontrar uma solução para a insurgência que aumentava.

A sorte de Petraeus

As forças americanas, contrariando todas as regras básicas de combate a insurgências, permitiram que o inimigo atacasse, como e quando quisesse, a estrada principal que ligava o aeroporto de Bagdá à Zona Verde.

Os soldados britânicos, com experiência adquirida durante o conflito na Irlanda do Norte, repetiam e voltavam a repetir que patrulhas ocasionais e nervosas de veículos blindados não dariam aos americanos o controle da rota.

Os americanos ignoravam o conselho e o problema foi piorando.

Foi preciso um especialista em operações contra terrorismo, o general David Petraeus, para inverter a situação. Como a maioria dos generais bem-sucedidos, ele teve sorte.

Petraeus sabia que insurgências têm duração limitada e foi afortunado o suficiente para chegar a Bagdá no momento em que a insurgência começava a diminuir.

Os muçulmanos sunitas estavam cada vez mais cansados da violência provocada por sunitas extremistas.

Petraeus encorajou os chamados Conselhos do Despertar, milícias financiadas pelos Estados Unidos onde sunitas tiveram oportunidade de subir na carreira e combater insurgências por membros do partido de Saddam - o partido Baath - e também por simpatizantes da Al-Qaeda.

O número de pessoas dispostas a perder suas vidas em ataques suicidas começou a diminuir.

A tática de Petraeus fez mudar a maré. Durante o ápice da violência, por volta de cem pessoas morriam por dia no país, vítimas de bombardeios e tiros.

Agora, o número de vítimas da violência política caiu para dez por dia - inaceitável em uma sociedade pacífica, mas um grande alívio para os iraquianos.

Futuro Incerto

Ainda assim, muitos iraquianos temem que, sem uma grande presença americana no Iraque, e com o Exército e polícia iraquianos ainda carentes de treinamento, os extremistas violentos no lado xiita e sunita comecem a lutar novamente.

O que quer que aconteça no país na próxima década, os americanos vão levar a culpa.

A não ser, é claro, que o Iraque se torne um país pacífico e próspero - e nesse caso, ninguém agradecerá os Estados Unidos.

Esse tende a ser o destino de todo poder de ocupação.

Vastas quantidades de pessoas morreram, a grande maioria delas, iraquianos.

Quantias inimagináveis de dinheiro foram gastas no Iraque e, ainda assim, o país caiu no ranking por riqueza dos países.

E será que os Estados Unidos se beneficiaram? Difícil saber como.

Como os britânicos aprenderam na Guerra Boer, na África do Sul, e os russos na invasão do Afeganistão, grandes poderes militares correm grandes riscos ao testar sua força contra oponentes aparentemente fracos.

Os Estados Unidos parecem ter encolhido como resultado direto de sua aventura imperial no Iraque.

Vão ter de trabalhar duro para provar ao mundo de que são fortes novamente.

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