segunda-feira, 27 de julho de 2009

Médicos em Guantánamo violam ética profissional


Um relatório publicado nesta sexta-feira na revista científica Lancet afirma que a participação de médicos em interrogatórios e práticas de alimentação forçada de prisioneiros na prisão americana em Guantánamo é uma violação dos códigos de ética da profissão.

O relatório critica o Departamento de Defesa por empregar profissionais de saúde nessas práticas, que qualificou de "brutais" e "inconsistentes com a ética médica", e afirma que o histórico da base na ilha de Cuba "arranhou a integridade dos médicos que trabalham para as Forças Armadas e a Agência de Inteligência Americana (CIA)".

"Médicos militares desenvolveram e implementaram métodos de interrogatório, incluindo privação de sono, isolamento, ameaças, nudez e posições de estresse", afirmam os autores do texto, os diretores-executivos das ONGs Médicos pelos Direitos Humanos, Leonard S. Rubinstein, e da Advogados e Médicos Globais, George J. Annas.

"A divulgação de memorandos até então secretos do Departamento de Justiça mostra o envolvimento de médicos que trabalham para a CIA criando, utilizando e monitorando métodos de interrogatório, incluindo a simulação de afogamento. O Comitê Internacional da Cruz Vermelha estabeleceu que esses métodos configuram tortura."

Em uma carta enviada à revista Lancet em março, médicos de diversos países já haviam protestado contra as práticas de Guantánamo. Na ocasião, o Pentágono respondeu que "declarações de organizações profissionais de médicos, advogados, dentistas etc. não são tratados internacionais e, portanto, não são de cumprimento obrigatório e não são aplicáveis a Estados-nações soberanos".

Alimentação forçada

No documento publicado nesta sexta-feira, Rubinstein e Annas criticam duramente o chamado Relatório Walsh, uma revisão da situação dos presos de Guantánamo apresentada em fevereiro deste ano pelo almirante Patrick M. Walsh e encaminhada ao presidente dos Estados Unidos, Barack Obama.

Walsh avalizou a prática de alimentar prisioneiros em greve de fome à força como um gesto necessário para poupar a vida e a saúde dos detidos.

A prática consiste em administrar uma substância nutritiva por meio de sondas nasais a prisioneiros que são imobilizados por até duas horas, amarrados com correntes na altura dos braços, das pernas e no peito.

"A equipe de Walsh não questionou os princípios éticos do uso desse protocolo", dizem Rubinstein e Annas. Eles expressaram sua oposição ao fato de um profissional não-médico (no caso o comandante da base) ser o responsável por determinar o procedimento.

Além disso, notaram, o uso de coerção e imobilização física é condenado pela Associação Médica Mundial como "tratamento desumano e degradante".

Interrogatórios sem ética

Rubinstein e Annas também criticam a participação de psicólogos e psiquiatras em sessões de interrogatório.

"A participação de especialistas em ciências comportamentais viola os princípios éticos das profissões de saúde. Interrogatórios quase sempre incluem maneiras de elevar os níveis de estresse dos prisioneiros, e são inconsistentes com o dever da beneficência", afirmaram.

Para eles, "mesmo na ausência de tortura", a prática "é uma violação do seu dever de não infligir dano, e portanto antiética".

Em outras ocasiões, o governo americano já expressou seu apoio à participação de profissionais de saúde em práticas da prisão de Guantánamo, afirmando que os médicos operam dentro das "políticas e procedimentos" do governo.

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