terça-feira, 16 de junho de 2009

Como a Ford foi “mandada embora” do Rio Grande do Sul


RS URGENTE
Inspirado na nota publicada no RS Urgente sobre Greg Palast, o leitor Celso Luiz, de Rio Grande, sugere que passemos a retomar alguns temas relacionados ao que o jornalista menciona em seu livro “A melhor democracia que o dinheiro pode comprar”: “sobre como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso fez o possível para punir os gaúchos pela eleição de Olívio Dutra”. E propõe que iniciemos essa reconstituição histórica pelo famoso “Caso Ford”. Para auxiliar nesta empreitada, ele envia algumas reportagens da época com informações que foram, para dizer de uma maneira generosa, muito pouco divulgadas pela imprensa gaúcha. Aqui no Estado, a versão que acabou passando para a população foi a de que o “PT mandou a Ford para a Bahia”. Foi mesmo? Começaremos a divulgar alguns relatos sobre o que foi publicado fora do Rio Grande do Sul sobre esse nebuloso episódio.

Iniciamos esse trabalho com um resumo de uma matéria publicada na revista Veja, no dia 14 de julho de 1999, que fala sobre os bastidores da operação milionária que levou a montadora para a Bahia. Nos próximos dias, publicaremos outros relatos que não são do conhecimento da maioria da população do Rio Grande do Sul. Tomemos então, para começar, o que a Veja – insuspeita de ser uma revista “aparelhada” pelo PT – publicou em 1999:

“A chamada “emenda Ford”, que concede benefícios fiscais para que a montadora americana instale sua nova fábrica na Bahia, foi armada dentro do próprio Palácio do Planalto, mais precisamente no 4º andar, onde fica o gabinete do ministro da Casa Civil, Clóvis Carvalho. Na manhã da terça-feira 29 de junho, o deputado José Carlos Aleluia, do PFL baiano, correu para o Palácio do Planalto e instalou-se na Casa Civil para discutir o tema. Ali, o deputado Aleluia costurou o texto, introduzindo o benefício à Ford na medida provisória 1740, junto com os auxiliares do ministro Clóvis Carvalho. Só no início da noite se chegou a um acordo sobre a forma final do texto, que foi então transcrito num dos computadores da Casa Civil e o disquete enviado à presidência do Senado.

Aberto no computador, o disquete revelava um texto modificando um artigo da Lei nº 9440, de 1997. O acréscimo dizia: ”Para os fins do artigo 11 desta lei, os prazos mencionados no artigo 12 e seu parágrafo único terão vigência até 31 de dezembro de 1999″. Traduzindo o burocratês: a Ford pode instalar-se no Nordeste e terá direito aos benefícios fiscais de um programa que estava encerrado desde 1997 e acabava de ser prorrogado. A alteração foi aprovada no Congresso, por 271 votos a favor e 129 contra (com os votos do PMDB gaúcho e dos demais partidos de oposição ao governo Olívio Dutra, que não hesitaram em votar contra o Estado para garantir que a Ford “fosse expulsa do Estado”. Nota do blog)

O caso ficou tão complicado que o governo resolveu baixar a cortina do silêncio: ninguém falava sobre a autoria da emenda, nem sobre o seu mérito. O Ministério da Fazenda, que era contra a “emenda Ford”, elaborou um estudo sobre o impacto fiscal da medida na arrecadação do governo, mas alegava que, como o presidente Fernando Henrique ainda não decidira oficialmente, nada podia ser comentado – nem a favor, nem contra. Dentro do Itamaraty, cresceu uma oposição forte à “emenda Ford”, já que atrapalha as relações do Brasil com a Argentina. A Argentina topou que o Brasil oferecesse benefícios às montadoras que quisessem se instalar no Nordeste, mas apenas até 31 de maio de 1997. A prorrogação desse prazo não estava no acordo. Mas, no Itamaraty, a ordem também era silêncio.

A confusão, além de expor trapalhadas internas do governo e ameaçar com uma crise política grave, ainda tem outro efeito desagradável: abafa o debate sobre um tema fundamental para o país. Afinal, as isenções fiscais às grandes empresas promovidas pela guerra econômica entre os Estados, de fato, gera um número de empregos compatível com os dispêndios dos governos? É vantajoso para o país? Ou serve apenas a empresa beneficiada? O silêncio que ministros e técnicos mantiveram na semana toda sinaliza que não existe unanimidade sobre o assunto dentro do governo – e esse mutismo também impede que a sociedade aprofunde seu conhecimento sobre a questão. Afinal, isenções fiscais, redução de impostos, empréstimos mais baratos, tudo isso afeta os cofres públicos, cuja única fonte de recursos conhecida é o bolso de cada brasileiro”.

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