segunda-feira, 26 de maio de 2008

O desafio é chegar aonde o povo está


EcoAgência:

"Pobre gosta de luxo. Quem gosta de miséria é intelectual." – Joãozinho Trinta

Por Vilmar Sidnei Demamam Berna*

Com a demissão da Ministra Marina Silva, a queda de braço entre progresso e meio ambiente está assumindo contornos cada vez mais claros no governo Lula. Por trás deste embate existe um mito, o de que a destruição ambiental é o preço amargo a pagar pelo progresso, emprego, comida, moradia, pontes e estradas, etc. Trata-se de um equívoco comprovado por Carlos E. F. Young, do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Entre 1985 e 1996, nos estados do Sul e do Sudeste, a Mata Atlântica perdeu mais de 1 milhão de hectares enquanto, no mesmo período e região, houve a redução de 2,4 milhões de postos de trabalho na agropecuária. Em outras palavras, a sociedade aceitou e tolerou a destruição ambiental, na esperança de ver atendidas as suas necessidades, e continuou com as mesmas carências de antes, só que agora em pior situação, com desempregos e continuando a conviver com a miséria e agora também com poluição e degradação ambiental.

Quando Lula diz em relação à Amazônia que "se manter a floresta em pé é tão importante para o mundo, é importante que o mundo compreenda que isso tem custo, por que na região moram 25 milhões de habitantes que querem acesso aos benefícios que todos têm" (O Globo – 15/05), na verdade está afirmando que com a floresta em pé não há como atender as necessidades das pessoas que moram lá e isso não é verdade por que a floresta em pé é capaz de atender muito mais as necessidades da população que uma terra arrasada. O governador de Mato Grosso, Blairo Maggi, foi mais claro em entrevista à Folha, em 24/04: "não há como produzir mais comida sem fazer a ocupação de novas áreas e a derrubada de árvores".

São visões que refletem na verdade o que vai no sentimento da população. No fundo, a maioria pensa assim mesmo, e não é por acaso. Existe, na verdade, uma guerra não declarada entre diferentes modelos econômicos, um predatório e concentrador de renda e outro sustentável. A opinião pública, sem saber, se torna refém dos manipuladores. Na verdade, não há negociação fácil entre o motosserra e a floresta. Não é possível pretender que a população tenha tal capacidade de consciência do problema se não recebe informações adequadas.

O problema não é exatamente como ser sustentável, por que já existem tecnologias e conhecimentos suficientes que nos permitiriam combinar crescimento econômico e preservação ambiental, sendo este, portanto, um falso dilema. O problema principal é ser SUSTENTÁVEL PARA QUEM? O atual modelo tem usado o planeta mais para concentrar a riqueza e o poder na mão de poucos que para atender a necessidade de muitos. O IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) comprovou que apenas 10% dos brasileiros mais ricos concentram 75,4% da riqueza do país e até hoje o Brasil não conseguiu aprovar um imposto sobre grandes fortunas e heranças, como já existe em outros países avançados.

Sempre que questionados, os poluidores e destruidores da natureza usam a esperteza de justificar a depredação ambiental como o preço a pagar para atender à necessidade de todos a uma vida melhor. Colocam-se junto à opinião pública como `amigos do Brasil e dos brasileiros', e acusam os ambientalistas de serem os `inimigos do Brasil e dos
brasileiros', uma manobra diversionista que tem confundido a opinião pública. Para assegurar que não serão desmascarados pela imprensa livre, tratam de dominar os meios de comunicação. O Epcom (Instituto de Estudos e Pesquisas em Comunicação), por exemplo, cruzou os dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) com a lista de prefeitos, governadores, deputados e senadores de todo o país e comprovou que os políticos de direita são os "donos da mídia" nacional. Ao total, 271 políticos são sócios, proprietários ou diretores de emissoras de rádio e TV.

Este número, porém, corresponde apenas aos políticos que possuem vínculo direto e oficial com os meios de comunicação – não estão contabilizadas as relações informais e indiretas (por meio de parentes e laranjas), que caracterizam boa parte das ligações entre os políticos e os meios de comunicação do país. E mais. Para não correrem o risco de perderem privilégios em função das ações de legisladores e administradores públicos independentes, os poluidores e destruidores do meio ambiente financiam campanhas para assegurar uma maioria de políticos comprometida com seus interesses privados e não com os interesses públicos.

O Brasil tem tido a sorte de ter ministros do meio ambiente competentes e comprometidos com a causa socioambiental, como o Sarney Filho, o José Carlos Carvalho, a Marina Silva, entretanto, o que pode fazer um ministério para preservar e cuidar do meio ambiente se praticamente todos os outros querem fazer o contrário? A ex-Ministra Marina Silva combateu o bom combate, ganhou algumas vezes a queda de
braço interna dentro do Governo e perdeu muitas outras. E quando ela perdia, perdia o meio ambiente com o transgênico sendo aprovado mesmo contra o parecer técnico do Ibama e da Anvisa, o desmatamento aumentando, a aprovação das hidrelétricas no rio Madeira, etc.

Nossas esperanças e nosso olhar se voltam agora para o novo ministro, Carlos Minc, com tradição na militância ambiental carioca, também Prêmio Global como o Chico Mendes, o Betinho, o Fábio Feldmann, entre outros. Numa democracia não vence quem tem mais armas, mas quem tem mais argumentos. E de todos os talentos do Minc que eu conheço, talvez o que mais se destaque é a sua capacidade de dialogar com os contrários sem abrir mão de princípios, seu jogo de cintura diante das situações mais difíceis e, especialmente, sua habilidade em falar com a imprensa, transformando temas áridos e de difícil entendimento em frases e conceitos claros para a população.

É preciso encontrar formas e maneiras de chegar ao povo, de mostrar que a destruição ambiental muito longe de assegurar o progresso e o atendimento às necessidades humanas tem significado a perda dos serviços da natureza que mantém a fertilidade do solo, o regime de chuvas, os mananciais de abastecimento, etc. Precisamos muito de alguém que consiga traduzir o ecologês para uma linguagem que chegue até ao povo e o Minc sabe fazer isso.

*Vilmar é escritor, jornalista e ambientalista. Por quase oito anos foi companheiro de ativismo do Minc nos Defensores da Terra e no mandato de deputado estadual e, assim como o Minc, também recebeu o Prêmio Global 500 da ONU Para o Meio Ambiente, em 1999, por indicação do Fábio Feldmann.

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